Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
Cavaco
Silva não foi um bom presidente da República. Entre outras razões porque, ao
longo dos últimos quatro anos, optou por ser o presidente de apenas uma parte
da República. A parte que se identificou com a prática política do Governo
PSD/CDS e que dela beneficiou. Apertando o critério, mais do que um presidente
da República, foi um provedor do Governo. Por exemplo: quando era evidente que
estavam a ser tomadas decisões fora da lei (a Constituição que jurou defender,
independentemente do pouco apreço que lhe tenha), Cavaco contemporizou,
deixando passar sem fiscalização sucessivos orçamentos. Outro exemplo: quando
se percebeu, no verão de 2013, que já não existia Governo, com a demissão de
Vítor Gaspar e a trapalhada do "irrevogável" Paulo Portas, fez aquela
disparatada proposta ao PS de antecipar eleições a troco de segurar Passos
Coelho no poder por mais um ano.
Mais
ainda: ao longo do mandato esteve sempre disponível para o apoio aos poderosos
e pouco preocupado com os deserdados. Pronto para um afago aos interesses da
Banca (o BES era um banco sólido em que valia a pena investir), ignorando o
sofrimento do cidadão comum: o que perdeu rendimento, o que perdeu o emprego, o
que emigrou, o que caiu na pobreza ou nunca de lá saiu (e há dois milhões e meio
de portugueses pobres). A única exceção haveria de ser com os pensionistas, mas
por interesse próprio: o que o atormentava, e partilhou-o com os portugueses, é
que, com os cortes na sua pensão (milionária), estava a ficar difícil pagar as
contas.
Ora,
de quem não foi um bom presidente da República, não se pode esperar, no
estertor do mandato, boas decisões. Cavaco decidiu que só daria posse a um
Governo estável e duradouro. Disse-o antes das eleições e insistiu logo a
seguir a conhecer os resultados eleitorais, quando era evidente que isso seria
impossível. Agiu, mais uma vez, não como presidente da República (a quem,
aliás, não gosta de prestar homenagem), mas como provedor da Direita, abrindo
caminho para a única solução que admite: um Governo liderado pelo PSD/CDS, com
apoio do PS.
Não
teve sorte, saiu-lhe tudo ao contrário. Foi Costa e não Passos quem saiu de
Belém a prometer um Governo estável e duradouro, com o apoio do BE e do PCP.
Acontece que Cavaco não foi um bom presidente, mas é fiel aos seus. Optará por
defender a família partidária e dará posse ao seu Governo, mesmo sabendo que o
prazo de validade se esgota em dez dias (período máximo entre a indigitação de
um primeiro-ministro e o da votação do seu programa no Parlamento). Sempre em
nome dos superiores interesses de uma pequena parte da nação.
Sem comentários:
Enviar um comentário