Renato Epifânio
Causou, uma vez
mais, brado a enésima declaração das autoridades alemãs, segundo as quais “a
Alemanha não aceita mais financiamento a países sem fortes condições e perda de
soberania”.
É extraordinário
que mesmo algumas vozes assumidamente “federalistas” reajam com tanta
indignação com a perspectiva de mais “perda de soberania”. Extraordinário mas
não surpreendente – é, de resto, por isso, que em Portugal é impossível
qualquer debate público claro e consequente. Qualquer debate se transforma,
mais cedo ou mais tarde, num jogo de sombras…
O debate em torno
do federalismo europeu é um excelente exemplo disso. Grande parte da nossa
classe mediática (ou seja, da nossa classe política e jornalística) assume-se,
cada vez mais, como “federalista”. O argumentário, qual mantra, é sempre o
mesmo: “só o federalismo pode salvar a Europa e Portugal”.
Não vamos agora
discutir essa posição – já por várias vezes defendemos que, mesmo admitindo que
o federalismo fosse desejável, ele não é de todo possível. A Europa é demasiado
diversa para ter um futuro político unificado a esse ponto. Essa diversidade é,
de resto, a nosso ver, a nossa maior riqueza. Talvez na Idade Média – em que,
para além de tudo o mais, havia uma mesma língua dominante e uma mesma religião
hegemónica – isso tivesse sido possível. No século XXI, não vale a pena
alimentar mais essa ilusão.
Mas para quem ainda
a alimenta, exige-se o mínimo de coerência. Não se pode defender ao mesmo tempo
o federalismo e ser contra as consequências necessárias de todo o processo
federalista. Há, decerto, muitos modelos – mas não há nenhum em que não ocorra
“perda de soberania”. Por mais que se deseje sol na eira e chuva no nabal, não
há milagres. É pois tempo de falarmos de forma clara e consequente. Até porque
esse eventual passo só será possível com um Referendo: o tal Referendo sobre a
Europa tantas vezes prometido.
Renato Epifânio em MILHAFRE: O BLOGUE DO MIL, O FÓRUM DA LUSOFONIA
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