quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Em crise, França corre risco de ter orçamento rejeitado pela Comissão Europeia



Lamia Oualalou,  Rio de Janeiro – Opera Mundi

País teria que fazer mais cortes para se adequar ao pedido pela união dos países do continente; na mesma situação, Itália fala que regras são "coisas do passado"

Um verdadeiro vexame está ameaçando a França nas próximas semanas. A Comissão Europeia, o órgão executivo da União Europeia (UE), está se preparando para rejeitar o orçamento do país para 2015. Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha foram advertidos repetidas vezes por Bruxelas de que o mesmo poderia acontecer com eles, mas a eventual decisão da Comissão de mandar de voltar o orçamento para a França, um dos pilares da UE, é o sinal que a crise esta chegando ao coração da zona do euro.

O crescimento da economia francesa esta muito aquém do resto da região. Em 2014, ele não deve passar de 0,4% (a média na zona do euro deveria atingir 0,8%), e de 0,8% em 2015 (1,3% na zona euro). O desemprego está acima de 11% e o rombo fiscal não estanca. O déficit orçamentário deveria fechar o ano em 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB), bem acima do limite teórico de 3% adotado dentro da zona do euro.

Durante a última cúpula europeia, França se comprometeu a reduzir em 0,8 ponto percentual o chamado “déficit estrutural”, ou seja, a parte do déficit que não depende da conjuntura econômica. No entanto, os cálculos da Comissão Europeia indicam que a diminuição será apenas de 0,2 ponto, quatro vezes menor que o objetivo.

O que é percebido pelas autoridades europeias como um “sério descumprimento” das regras deveria incentivá-las a rejeitar o orçamento para salvar sua credibilidade. O fato de alguns países ricos, como a França, desrespeitarem os acordos, deixa a UE com menos força para exigir mudanças drásticas nas economias menores da região, como Portugal ou Grécia.

Último ato

A possível decisão de reenviar o orçamento de volta para Paris deve ser o último ato da gestão do atual presidente da Comissão, o português José Manuel Barroso, que será substituído no fim do mês por Jean-Claude Juncker, ex-premiê de Luxemburgo. Segundo Bruxelas, Paris deveria reduzir as despesas públicas em 8 bilhões de euros.

O governo francês tem dito que não adotará mais medidas para apertar o cinto além do que foi proposto até agora, sinalizando que está pronto para se arriscar em um confronto com as autoridades europeias.  “Já cortamos 21 bilhões de euros no orçamento de 2015, não vamos fazer um esforço maior. Também não vamos aumentar os impostos para reduzir o déficit”, reagiu o ministro da Fazenda, Michel Sapin.

Ele argumenta que não faz sentido cortar mais os gastos diante da piora do cenário econômico e político. Enquanto a popularidade do presidente francês François Hollande é a menor da história – o desempenho dele é aprovado por apenas 13% da população – o sentimento antieuropeu está crescendo na França. A rejeição do orçamento poderia ser usada, por exemplo, pela Frente Nacional, partido de extrema-direita de Marine Le Pen.

Os aliados do governo consideram “inimaginável” a Comissão recusar o orçamento. “É o trabalho de nosso parlamento de votar os orçamentos e decidir os impostos, eu cansei das aulas particulares que Bruxelas quer nos administrar”, reclamou, por exemplo, o deputado socialista Arnaud Leroy.

Itália

Se optar pelo embate com a Comissão Europeia, França não ficaria só. A Itália também já informou que não atingirá a meta do orçamento, e o primeiro ministro, Matteo Renzi, declarou no dia 6 de outubro que as regras orçamentárias da EU eram “uma coisa do passado”. Para o ministro Sapin, “nós entramos em um período que requer uma mudança da doutrina econômica na Europa”, declarou à radio francesa Europe 1.

A posição francesa contra uma política ainda mais restritiva não seria suficiente, porém, para voltar a atrair os eleitores de esquerda. No mesmo momento em que o governo defendia o orçamento, o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, afirmava que o projeto de um imposto de 75% sobre as fortunas do país, uma promessa do então candidato Hollande, seria totalmente enterrado.

Diante de uma plateia de empresários e de banqueiros reunidos na City, o templo da finança em Londres, Valls assegurou que o imposto era apenas uma medida provisória, que não seria reconduzida em 2015. E para concluir, ele acrescentou, em inglês, “My government is pro-business” [Meu governo é pró-negócios].

Na foto: Hollande, presidente da França, e Valls, primeiro-ministro: país corre risco de ter orçamento rejeitado

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