sábado, 20 de maio de 2023

A história do movimento negro em Portugal é longa, mas foi reprimida e silenciada

Reprimida e silenciada - até agora

Muito já se escreveu sobre o passado colonial, imperial e escravocrata de Portugal, mas as histórias das pessoas negras foram sempre secundárias. As personagens na luta contra o racismo eram, na sua maioria, brancas. Mas, a partir de 1911, houve um movimento negro que defendeu direitos para as populações negras, lutou contra o trabalho forçado, denunciou as limitações à mobilidade social, exigiu mais infraestruturas nas antigas colónias (escolas, hospitais) e, no palco internacional, promoveu o pan-africanismo. O combate ao racismo foi transversal à sua teoria e ação política.

Mas o movimento foi reprimido, primeiro pela Ditadura Militar e depois pelo Estado Novo, e relegado ao esquecimento, silenciado pelo poder político, económico e social. Até agora. A socióloga Cristina Roldão, o historiador José Augusto Pereira e o antropólogo Pedro Varela vasculharam inúmeros arquivos para contarem a história do movimento negro entre 1911 e 1933. O resultado foi o livro Tribuna Negra – Origens do Movimento Negro em Portugal (1911-1933), publicado pela Tinta-da-China. O livro foi o mote para uma conversa sobre o movimento negro.

Tal como o movimento negro aprendeu ao longo da sua história, conquistar-se direitos na lei não é o mesmo que ter-lhes acesso no dia-a-dia. Um outro exemplo disso é o direito ao acesso ao aborto. Carolina Monteiro argumenta neste ensaio que já não é possível negar que estarem a ser impostas restrições no acesso ao aborto. Ou seja, há um boicote silencioso contra o direito ao aborto. Não basta ter uma lei, tem de ser orientada e cumprida. Quando vai acabar o tempo do boicote tolerado (e alimentado) pelo sistema?

Quem põe em causa os direitos das mulheres é o Chega. Fá-lo programática e discursivamente com populismo ideológico e comunicacional. Sofia F. Santos analisa a estratégia de comunicação do Chega e como tem conseguido explorar emoções negativas e aproveitado a curta capacidade de atenção das pessoas, ultra simplificando realidades complexas. Fá-lo enquanto não apresenta soluções para os reais problemas de quem vive e trabalha em Portugal, e quando o faz é por puro oportunismo político.

Nesta edição Nuno Serra, dos Ladrões de Bicicletas, critica a hipocrisia de Nuno Crato. O ex-ministro da Educação foi responsável por termos perdido 30 mil professores durante a sua governação (2011-2015) e agora lamenta, na televisão e com lágrimas de crocodilo, haver poucos docentes. Não esquecemos como as suas políticas prejudicaram alunos e professores.

Por fim, a cronista Paula Cardoso escreve que os primeiros passos do novo Observatório do Racismo estão muito aquém das expectativas. “Até agora contam-se três pessoas no Observatório, todas brancas, e cuja trajectória profissional não permite compreender como aí foram parar. Querem mais brancos costumes do que estes. Talvez seja a isto que se referem quando falam em meritocracia”, critica.

É tudo esta semana. Boas leituras e bom fim de semana,

Ricardo

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