domingo, 20 de janeiro de 2013

Portugal: DESNORTEADOS




Fernando Gomes – Jornal de Notícias, opinião

Definitivamente, as coisas estão feias para o Norte do país. Sendo certo que a generalidade dos portugueses está a viver o seu pior tempo depois do 25 de Abril, é evidente que a situação tem vindo a ficar ainda mais difícil para os que vivem na região norte. Acresce que não se vislumbra, por parte de quem nos governa, qualquer atitude para corrigir o ritmo deste declínio. Bem pelo contrário.

Rememorando o que aqui tem acontecido, as decisões mais recentes demonstram a total indiferença dos poderes públicos nacionais perante a degradação económica e social da região.

Como pudemos constatar há algumas semanas, através dos números publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, a riqueza produzida na Região Norte tem vindo a decair perigosamente, a ponto de sermos hoje a mais pobre das regiões portuguesas, Madeira e Açores incluídos. De pulmão da economia nacional, centro da indústria transformadora e motor do crescimento, depressa passamos para a cauda do pelotão. A coesão económica e social tão incensada em termos europeus, é em Portugal uma miragem. Como já antes aqui referi, o fosso que nos separa da região mais desenvolvida - a de Lisboa - tem vindo a aumentar em vez de se atenuar. É claro que esta situação não aconteceu hoje.

Mas o que é por de mais perturbante é a forma como se tem acentuado este agravamento nos últimos tempos, sem que nada tenha sido feito para o evitar. Bem pelo contrário, a preocupação aumenta quando nos damos conta da sobranceira indiferença com que a situação é encarada por quem nos governa. Chego a pensar se esta não é uma atitude deliberada para procurar diminuir a tradicional capacidade afirmativa do Norte, mostrando o Governo, com a sua intransigência, que não se deixa influenciar e que não cede a pressões. Não haverá melhor exemplo para o país do que procurar calar quem tem visibilidade e abafar desde logo a reivindicação, por mais justa que ela seja.

Senão, como se entenderiam os conflitos com a Casa da Música, em que o Governo diz e se desdiz, ou a incompreensível subalternização dos estúdios do Monte da Virgem da RTP, tão profusamente referidos na Comunicação Social?

E como se tudo isto não bastasse, aparece agora a inesperada proposta para serem introduzidas mais 16 portagens em ligações viárias, sendo que 14 delas se concentram no Norte do país. São demasiados sinais de desnorte. Como muito bem diz Rafael Barbosa no seu comentário de sexta-feira "chama-se a isto equidade, em versão centralista".

Para se entender a injustificável atuação do Governo, só há uma outra possibilidade - é ele não ter uma linha de rumo para o país e andar à deriva. Tendo como único objetivo cumprir as metas assumidas com a troika, corta onde pode e onde não pode, sem curar das consequências e tenta esbulhar o último punhado de euros dos bolsos de quem ainda os possa ter. À falta de um projeto para o país que nos faça crescer e, por essa via, permita aumentar a receita fiscal, vale apenas o programa dos credores.

O que mais assusta é vermos que o Governo entende que está no bom caminho. As trombetas do potencial sucesso de um défice perto dos 5% , mesmo que com receitas irrepetíveis, já se fazem ouvir e ainda não sabemos se o conseguiremos. É evidente que o controlo do défice é importante. Mas ele não pode ser atingido a qualquer preço, como repetidamente se tem dito.

A luta política sobe de tom. Sente-se que os portugueses estão no limite da sua capacidade de resistência. O Partido Socialista, única alternativa visível de Governo, aumentou esta semana a parada e fala objetivamente de eleições antecipadas, pedindo maioria absoluta. Os partidos da coligação, por seu turno, contra-atacam e desvalorizam a tomada de posição do PS argumentando que tal se deve a lutas internas pela liderança (o que, se fosse verdade, o descredibilizaria completamente).

O ambiente que se vive no país é tudo menos calmo. O número e a importância das vozes que se faziam ouvir contra uma possível crise política diminuiu a olhos vistos. Se o país está mal, o Norte está pior. Mas uma coisa é certa - aconteça o que acontecer, já nada temos a perder. Ao fim e ao cabo, qualquer alternativa será sempre para nós um motivo de esperança.

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