quarta-feira, 22 de agosto de 2012

NO HUAMBO CHEIRA A DERROTA DO MPLA




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

José Eduardo dos Santos decidiu excluir a província do Huambo do seu calendário de deslocações eleitorais. Razões? Fernando Faustino Muteka e o MPLA estão a sentir o cheiro da derrota.

Por mérito da UNITA e muita prepotência de Faustino Muteka, governador provincial e primeiro secretário do MPLA, o Povo acordou e, mesmo temendo represálias de todo o género, mostra-se disposto a lutar, a voltar a lutar, pela sua dignificação.

Dez anos depois, são muitos os que se recordam e recordam que, no dia 24 de Fevereiro de 2002, alguém lhes disse: “sekulu wafa, kalye wendi k'ondalatu! v'ukanoli o café k'imbo lyamale!” (morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratados).

E é esse Povo que, de barriga vazia, sem assistência médica, sem casas, sem escolas, parece ter acordado do enorme pesadelo que lhe foi imposto pelo MPLA. E esse povo que, como dizia o arcebispo da minha cidade (Huambo), D. José de Queirós Alves, ainda não tem força mas tem razão.

Talvez no dia 31 consiga esse bom Povo mostrar que, mantendo a razão, ganhou mais força. Esse é um Povo que tem memória, que não esquece,

E não esquece, entre muitas outras coisas, que no dia 12 de Janeiro de 2008 o então Ministro da Defesa de Angola, Kundy Paihama, “botou faladura” num comício na Sede do Município da Matala e prestou um alto serviço ao país e até, digo-o em consciência, ao mundo democrático.

“Não percam tempo a escutar as mensagens de promessas de certos Políticos”, disse com o seu habitual brilhantismo oratório o então ministro da Defesa do MPLA e do regime que (des)governa Angola desde 1975, acrescentando: “Trabalhem para serem ricos”.

A maioria do povo angolano, 68%, que vive abaixo da linha de pobreza entendeu a mensagem.

Digam lá que Kundy Paihama não é o espelho fiel do rei Eduardo dos Santos, o tal que hoje, como em 2008, promete um "caminho seguro para uma Angola melhor"?

Continuemos apelando à memória para bem dos milhões que têm pouco ou nada e que, ao contrário dos generais que compram quintas em Portugal para produzir vinho, nem dinheiro têm para um copito, com as verdades de Kundy Paihama que, digo eu, deveriam fazer parte das enciclopédias políticas das universidades angolanas e, porque não?, de todo o mundo civilizado.

“Durmo bem, como bem e o que restar no meu prato dou aos meus cães e não aos pobres”, afirmou Kundy Paihama. Não, não há engano. Reflectindo a filosofia basilar do MPLA, disse exactamente isso: o que sobra não vai para os pobres, vai para os coitados dos cães.

A maioria do povo angolano, 68%, que vive abaixo da linha de pobreza entendeu a mensagem.

E por que não vai para os pobres?, perguntam os milhões, os tais 68%, que todos os dias passam fome. Não vai porque não há pobres em Angola. E se não há pobres, mas há cães…

Continuemos com o discurso de Kundy Paihama: “Eu semanalmente mando um avião para as minhas fazendas buscar duas cabeças de gado; uma para mim e filhos e outra para os cães”.

É claro que, embora reconhecendo a legitimidade que os cães de Kundy Paihama e do regime que (des)governa Angola desde 1975 têm para reivindicar uma boa alimentação, os angolanos que não são do MPLA parecem não querer transformar-se em cães para ter um prato de comida.

Será, portanto, com o voto de todos eles que vão ajudar Angola a mudar, de modo a que todos os que não pensam como Kundy Paihama tenham direito a comer como os cães do regime.

Entretanto, a UNITA acredita que cada vez mais os “angolanos começam a perceber melhor os desvios dos objectivos da paz e da reconciliação nacional”.

Tem razão. Mas, como se sabe, se nem nas democracias basta ter razão, num regime de partido único travestido com alguns laivos de democracia, como é Angola, ter razão é o que menos conta.

Diz a UNITA que em Angola “continua a violação dos Direitos, Liberdades e Garantias fundamentais dos cidadãos angolanos, consubstanciada nas detenções arbitrárias, particularmente nas zonas onde a UNITA goza de maior simpatia”.

Nada de novo. É assim em Angola, tal como é assim na colónia angolana de Cabinda. Os donos do país, com a criminosa conivência da comunidade internacional, casos da ONU, UA e CPLP, continuam a comer lagosta e a dar ao Povo peixe podre, fuba podre (ou farelo), cinquenta angolares e porrada se refilares.

Enquanto Angola for o MPLA e o MPLA for Angola, de nada adiantará ter razão. A UNITA sabe-o bem. Aliás, parte dela trocou também a mandioca pela lagosta. E quando assim é...

Dizer que o regime liderado, recorde-se, por um presidente que está no poder há 33 anos sem nunca ter sido eleito, é contra todas as formas de luta que ponham em causa o seu reinado, é chover no molhado. Ninguém se preocupa com isso.

Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacional reconhece mas sem a qual não sabe viver. Aliás, é mais fácil roubar o Povo em regimes corruptos do que em democracias.

Aliás, basta ver como as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investem forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios.

“Contínua a degradação da situação socioeconómica e cultural, estando na base do aumento dos níveis de violência, delinquência, pobreza e doenças endémicas que o País conheceu”, afirma a UNITA, acrescentando que continuam as práticas que reforçam o Estado patrimonialista e clientelista, visando condicionar a vontade e a consciência dos cidadãos, mediante voto prévio e induzido para o partido no Poder”.

O MPLA tem tanta força que, para além de os mortos também votarem nele, há sempre aquela variante que legitima as boas democracias e que respeita ao facto de em alguns círculos eleitorais apareceram mais votos do que votantes.

Reconheça-se que é obra apresentar resultados (obviamente democráticos) em que o MPLA ultrapassa os 100 por cento das votações.

Enquanto a UNITA não perceber que está a fazer de figurante para legitimar uma democracia inexistente, que está a fazer de porteiro para o regabofe dos ditadores, que está com uma bandeja de prata à procura de comida nos caixotes do lixo dos donos do reino, nunca conseguirá mudar Angola.

Mas, talvez mais importante do que tudo, a democracia não será edificada em Angola enquanto, como dizia o Mais Velho, não for a dor que nos faz andar, a angústia que nos faz correr, as lamúrias e as lamentações, que de vários cantos do país nos chegam, que nos fazem trabalhar; não for a razão dos mais fracos contra os mais fortes que nos faz marchar.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.


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