Em entrevista ao Brasil
de Fato, Frank La Rue recorda que a concentração da comunicação leva à
concentração de poder político
Tatiana Lima, do
Rio de Janeiro (RJ) – Brasil de Fato
Desde as
manifestações deflagradas em junho, a credibilidade de jornais e redes de
televisão são alvos de críticas por parte da população que participa dos
protestos. Principalmente, após vídeos, fotos e depoimentos postados em redes
sociais como Facebook e Yotube, feitos por manifestantes durante os atos.
Cartazes e faixas com dizeres como “Abaixo a Rede Globo” e “Ocupe a Mídia” tem
sido a tônica de manifestações no Rio e em outras cidades do país.
Segundo Frank La
Rue, relator especial para a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de
Opinião e Expressão da ONU, essa insatisfação popular é reflexo da falta de
pluralidade de vozes e da concentração dos meios de comunicação nas democracias
da América Latina, dentre elas, na do Brasil.
Para ele, enquanto
existir somente uma visão comercial da imprensa, a liberdade de expressão e a
própria democracia estão ameaçadas. “Estamos forçando a população a pensar de
uma única forma”, alerta.
Brasil de Fato –
Qual é o problema de só existir essa visão comercial da imprensa?
Frank La Rue - Eu
não tenho nenhum problema com a visão comercial, mas a comunicação deve por,
acima de tudo, os serviços sociais. É uma vocação dos comunicadores.
Então, umas mídias
podem ser comerciais, outras comunitárias e públicas, além das telecomunicações.
Falo, portanto, de um sistema de comunicações éticas nacionais para grupo
indígenas, étnicos, mulheres, grupos específicos. Portanto, democratizar a
comunicação significa: primeiro, romper com sua concentração.
Porque essa
concentração de mídias é um atentado contra a democracia. A democracia
necessita de diversidade de meios e de pluralidade de ideias para que cada um
possa construir seu pensamento e suas opiniões com liberdade. E na América
Latina, não há diversidade e pluralismo. Então, estamos forçando a população a
pensar de uma só forma.
Qual é o perigo
prático disso?
O perigo é a
blindagem de governos ruins e corruptos. É o que aconteceu na Itália, com o
ex-primeiro-ministro Berlusconi, que governou o país por nove anos. O caso dele
nos mostra que a concentração da comunicação leva à concentração de poder
político.
E isso pode ser
muito perigoso para a democracia. Por isso, romper com o monopólio das
comunicações é uma prioridade. A democratização dá oportunidade a todos os
setores da sociedade de participar e de poderem se expressar.
A Declaração de
Direitos Humanos dos povos indígenas das Nações Unidas, por exemplo, diz que
todo povo tem o direito a ter uma cultura, valores expressados em seu idioma,
de reproduzir esses valores para outras gerações e disseminá-los para o mundo
inteiro.
E mais adiante,
essa mesma declaração, diz que eles têm o direito de usar meios de comunicação
social e de até ter seus meios de comunicação próprios.
Então, está correto
dizer que a concentração dos meios de comunicação é uma violência à liberdade
de expressão?
É uma violação, não
digo uma violência. Há concentração. A falta de pluralidade viola o direito
humano à comunicação e à expressão de ideias.
Em relatório
entregue à ONU ano passado, o senhor incluiu tanto comunicadores populares e
comunitários, quanto blogueiros na definição de profissionais de jornalismo,
considerando todos como jornalistas. Por que é importante essa compreensão do
exercício da profissão de jornalista?
Pela função. Eu
insisto que o jornalismo se define pela função e não pelos estudos. Todos
exercem a mesma função: dedicam-se a organizar a informação para transmitir
essa informação tratada a um setor específico da população. São jornalistas. É
isso que quero dizer. É essa tarefa que estamos protegendo, porque é o direito
da sociedade estar informada. É a vocação do jornalismo.
Foto: New America
Foundation
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