sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Portugueses pelo mundo. Mais de um milhão em busca de novas oportunidades




Beatriz Silva – Jornal i

Europa ocidental, Angola, Moçambique e Brasil são apontados como os locais de eleição para fugir à crise e a grande aposta das empresas nacionais

Os números não mentem. Desde 1998 que Portugal tem sentido o efeito da emigração. Nestes últimos anos já saíram do país mais de um milhão de portugueses – só em 2011 o número aumentou 85% em relação a 2010, sendo a faixa etária entre os 25 e os 29 anos a mais atingida. A crise, associada à precariedade terá potenciado estas decisões, principalmente entre os muitos jovens qualificados que se vêem obrigados a procurar emprego noutro país face à elevada taxa de desemprego.

De acordo com os últimos dados do Eurostat, o desemprego aumentou 0,1 pontos percentuais, passando para os 16,3%, o que inclui Portugal no grupo dos países com as maiores subidas no desemprego em relação a 2011. Só entre os jovens a taxa ronda os 38,7%. No entanto, trata-se de uma realidade à escala global. Os últimos dados divulgados no decurso da Conferência de Emprego da International Finance Corporation (IFC), membro do Grupo Banco Mundial, em Washington, revelam que a maioria dos mais de 200 milhões de desempregados que existem no mundo são jovens.

O i fez uma ronda entre alguns portugueses que procuram melhores condições longe do nosso país para falarem das suas experiências, dos desafios que enfrentam e também para desabafarem. Manuel Luiz, principal consultor na Boston Consulting Group, na América Latina, situada no Rio de Janeiro, garante que a “a impossibilidade de progredir na carreira profissional a um ritmo condizente com a sua ambição” foi o que o motivou a começar uma carreira no estrangeiro, revelou no âmbito da iniciativa Alumni Abroad: Sharing Experiences, organizado pela Católica do Porto.

Se por um lado há quem se aventure em busca de novas oportunidades, outros têm a sorte do seu lado. É o caso de Rui Gomes Araújo, presidente-executivo da BABE, no Brasil: “A oportunidade de liderar a internacionalização de uma empresa portuguesa e a vontade de descobrir Portugal no mundo” foi o que originou a sua saída.

ANALISAR ANTES DE EMBARCAR 

O descontentamento pode levar a tomar decisões erradas e precipitadas. “Não embarquem na jornada se não tiverem uma oportunidade concreta”, alerta Manuel Luiz, referindo que é fundamental “tomar decisões ponderadas e racionais”. “Testar, garantir e avaliar. E não deixar que a emoção associada a uma eventual vontade ou necessidade de fugir de Portugal condicione uma racional avaliação das qualidades e oportunidades do país de destino”, aconselha Rui Gomes Araújo.

As razões da emigração são muitas e nunca fáceis. E a chegada também não é melhor. São muitas as diferenças encontradas no meio empresarial, como explica ao i António Yü Gaspar, regional manager da Unicer na Suíça. “Trabalhar os mercados internacionais envolve a alteração de processos e mentalidades dentro das empresas, que muitas vezes estão mais vocacionadas para trabalhar no mercado doméstico”, sustentando que “a quebra de dogmas” é fundamental para se aproveitar as oportunidades internacionais. A opinião é partilhada por Rui Gomes Araújo, que refere “o contraste entre a burocracia do Estado e a informalidade nos negócios” como uma das grandes diferenças no mercado empresarial.

Não são apenas estas diferenças que os três empresários realçam. Se neste momento “contenção” é a palavra de ordem em Portugal, noutros países “crescimento” é tabu. “Quando saí de Portugal os projectos tinham um foco significativo em racionalização, eficiência, corte de custo. No Brasil o foco é mais uma estratégia de crescimento, investimento e aquisição”, referiu Manuel Luiz.

Já Rui Gomes Araújo destaca a “dinâmica de mercado interno e a qualidade da elite empresarial” como dois factores de grande diferenciação. Não quer isto dizer que Portugal não tenha boas referências no mercado, pelo menos é o que explica Yü Gaspar. “Existem bons profissionais num quadro de oportunidades limitado”, acrescentando que “não pensamos que existem muito melhores profissionais que em Portugal… Há bons e maus profissionais em qualquer parte do mundo. O grande problema do mercado nacional está relacionado com o facto de ser pequeno e pouco competitivo, com problemas na qualidade da oferta e na qualidade da procura”, sustenta Rui Gomes Araújo.

MÃO-DE-OBRA QUALIFICADA 

Esta procura por maiores oportunidades pode estar a criar entraves ao crescimento da própria economia portuguesa. Para alguns, a emigração, associada à falta de oportunidades de emprego, poderá ser um obstáculo ao crescimento económico, para outros o impacto torna-se positivo. “Todos os estudos sobre a emigração mostram que toda a gente ganha com ela – o país de onde se emigra, o país que recebe, e normalmente a pessoa que emigra também”, referiu à Lusa João César das Neves. Aliás, é o que defende Pedro Ferraz, presidente da Alumni Abroad da Católica Porto.

“Ir lá para fora é bom para o trabalhador, que acaba por enriquecer a sua experiência, sendo no futuro valorizada, quer fique no estrangeiro quer opte por regressar”, sustentou. Pedro Ferraz defende ainda que “estar no estrangeiro” transmite uma ideia positiva do país de origem, facilitando também a entrada no mercado externo das empresas portuguesas. “As próprias empresas portuguesas estão a abrir oportunidades no estrangeiro. No actual contexto há menos oportunidades no mercado doméstico e por isso as empresas estão a virar-se para os mercados externos. Faz parte da estratégia de internacionalização”, afirmou.

Por esta razão, e porque faz parte da globalização, a maioria das universidades tem programas para facilitar o intercâmbio. “Há muitos alunos que vão estudar para outros países, no âmbito dos seus cursos, das suas licenciaturas e vice--versa”, explica o responsável. António Yü Gaspar refere que “o Erasmus feito em França contribuiu para abrir horizontes e ter a verdadeira percepção das culturas e distâncias dentro do espaço europeu”.

Europa ocidental, Angola, Moçambique e Brasil são apontados como os locais de eleição para fugir à crise e também são estes os locais em que as empresas nacionais apostam.

“No caso da Alumni, temos muitas pessoas a ir para a Europa ocidental, pois é aí que ficam os países mais próximos. Depois há mercados em que existe uma grande afinidade cultural. Os casos do Brasil, de Angola e Moçambique, que levam as empresas portuguesas a apostar nesses mercados”, explica o presidente da Alumni Abroad.

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