Financial Times,
Daily Express, The Sun & 3 outros – Presseurop – foto AFP
Após semanas de
especulação, o primeiro-ministro britânico fez finalmente o seu discurso
decisivo sobre o futuro da Grã-Bretanha na União Europeia. Comprometeu-se a
negociar um novo acordo com a União Europeia antes de promover um referendo até
ao final de 2017. Para a imprensa do Reino Unido, o discurso deixou grandes
incertezas quanto ao futuro.
"Não há
inevitabilidade nenhuma na saída da Grã-Bretanha da União Europeia. Contudo, a
história pode registar que David Cameron colocou a nação nesse caminho",
escreve o colunista Philip Stephens, do Financial Times, após o
primeiro-ministro britânico ter discursado em Londres, no dia 23 de janeiro.
Não era esse o
propósito do primeiro-ministro, quando fez o seu muito protelado discurso sobre
o futuro da Grã-Bretanha na Europa. Apesar de ter prometido uma dura
renegociação dos termos da participação britânica, seguido de um referendo em
termos de ficar ou sair na próxima legislatura, se os Conservadores ganharem a
eleição geral de 2015, tratou o caso como indo permanecer na UE. Trata-se de
uma política de corda bamba – um discurso calculado para manter unido um
Partido Tory [Conservador] rebelde e cada vez mais eurocético, e não a
expressão corajosa de um estadista.
"O Reino Unido
vai ter um referendo sobre a UE", traz o Daily Express na primeira página,
clamando vitória para a sua campanha pela votação pelo Não. O colunista Patrick
O'Flynn observa que Cameron anunciou a sua intenção de defender um voto
pró-europeu, antes de saber que concessões consegue negociar. Diz mais:
Cameron tem a
possibilidade de entrar para a história como um primeiro-ministro que marcou
uma época privilegiada, ao considerar que a Grã-Bretanha tem um futuro melhor
fora da UE, enquanto nação de comércio global. Dado que a longo prazo as
tendências económicas estão a condenar a Europa, enquanto outras regiões da
economia mundial estão a crescer depressa, estou confiante em que ele alinhe
com este jornal e os seus leitores, quando houver um referendo. Muitos em
Westminster vão achar isso impensável. Mas há dois anos, diziam que era
impensável um referendo sobre a adesão. E veja-se onde estamos hoje.
Esta decisão de
colocar a participação na UE nas mãos do povo é "um risco elevado, mas um
apelo corajoso", escreve o editor de política
nacional deThe Sun, Tom Newton Dunn, comparando a iniciativa a colocar
"uma arma carregada à cabeça dos dirigentes europeus e dizer: deem à
Grã-Bretanha o que ela quer ou vamos embora". Descrevendo as futuras
negociações do primeiro-ministro como "um jogo de póquer de intenso bluff com
Bruxelas, e com a parada mais alta", acrescenta:
O sucesso ou
fracasso irá definir toda a sua governação. O primeiro-ministro é culpado de
uma das suas próprias acusações de hoje: também ele tentou ignorar o cisma
crescente no país relativamente à Europa, na esperança de que desaparecesse por
si. Não aconteceu e hoje ele vai tentar transformar esse fracasso em virtude.
Cameron está, pelo menos agora, a enfrentar a questão de frente, e só por isso
merece elogio.
Para o correspondente de política nacional da BBC,
Iain Watson, a decisão de um referendo de ficar ou sair irá fazer as delícias
dos muitos eurocéticos do partido de Cameron e unir os Conservadores antes da
eleição de 2015. Mas o processo de renegociação pode vir a desencadear novas
divisões.
O que o
primeiro-ministro não disse hoje foi o que faria se as negociações ficarem
aquém do que gostava. Os Trabalhistas e os democratas-liberais dizem que David
Cameron está a criar uma incerteza prejudicial para os negócios, mas ele
retribuiu-lhes a acusação. Vão deixar que seja ele o dirigente do único grande
partido que pretende dar aos eleitores uma palavra a dizer sobre a participação
na União Europeia, após a próxima eleição?
O blogue "Blighty" de The
Economist observa que qualquer renegociação dos termos da
participação do Reino Unido será "mínima e terá um pesado custo
diplomático".
Westminster tem
dificuldade em compreender o vasto projeto político que ganha vida do outro
lado do Canal da Mancha. Para a Grã-Bretanha, a relação com a União Europeia
coloca-se ao nível das transações. Para as nações que estão no centro da
Europa, é um sentimento de destino partilhado que lubrifica a engrenagem dos
compromissos. Daí a perplexidade dos vizinhos da Grã-Bretanha. A noção de
exigências definitivas e quase unilaterais está o mais afastada que é possível
das preocupações de Paris, Berlim ou Bruxelas. No entanto, estão no cerne do
plano de Cameron para manter a Grã-Bretanha na União Europeia. Não é de
admirar, pois, que o plano pareça pouco firme.
James Kirkup, editor-adjunto de política nacional
do Daily Telegraph diz que o discurso de Cameron recolocou o foco
do projeto europeu num princípio económico e com base no mercado, o que pode
ser bem acolhido pela Holanda, Suécia e Finlândia. No entanto, outros "não
vão reagir bem ao que lhes vai parecer uma tentativa de chantagem por parte de
um dirigente politicamente demasiado fraco para resistir no seu próprio partido".
Acrescenta:
Cameron só vai
conseguir negociar o seu acordo se o resto da União Europeia concordar.
Portanto, sim, a forma como o resto da UE, especialmente a Alemanha, encara
este discurso é importante. De facto, pode muito bem determinar o destino de
Cameron: quanto mais progressos fizer na sua negociação, mais gente do seu
partido arrastará consigo para o campo do Sim, em 2017. É a tua deixa, Angela.
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