Nuno Ramos de
Almeida – Jornal i, opinião
Passou quase século
e meio desde a tentativa dos operários insurrectos de Paris de construírem um
mundo justo. Falharam mas provaram que nada muda sem coragem
No dia 18 de Março
de 1871 foi proclamada a Comuna de Paris. A primeira tentativa de os
trabalhadores tomarem o destino nas suas mãos foi afogada num banho de sangue.
Os historiadores falam de dezenas de milhares fuzilados (entre 7500 e 30 mil
executados).
A derrota da Comuna
de Paris não enterrou o sonho de uma maior igualdade, liberdade e fraternidade,
para usar os termos da Revolução Francesa, nem a vontade de construção de um
poder que expresse a vontade maioritária daqueles que trabalham. Não há revolução
sem revolucionários: A insurreição alastrou porque havia 600 mil operários numa
população de milhão e meio que já não suportavam as suas condições de vida e
não toleravam a entrega, pelo governo, da cidade aos invasores prussianos.
Como escreveu Marx,
cansados da servidão, os operários parisienses tentaram tomar os céus de
assalto. Tinham tudo contra eles, mas preferiram o risco a viver de joelhos.
Quase século e meio
depois, muito aconteceu e muito mais está por acontecer.
Basta olhar para
Portugal para perceber que a injustiça e a desigualdade continuam a mandar.
Apesar do progresso obtido pela luta de gerações, temos o país mais desigual da
União Europeia.
Aquilo que nos
garantem os governos de turno é apenas um presente insustentável e um futuro
ainda pior.
Prometem diminuir a
dívida e aumentam-na para quase 123%. Garantem querer melhorar a economia e
provocam uma recessão de mais 2,2%. Afirmam combater o desemprego e conseguem
passar dos 19% de desempregados durante este ano. A sétima avaliação da troika
ao governo da sua colónia é a confirmação das sete pragas desta política.
Os ministros deste
governo são patéticos, mas desenganem-se aqueles que garantem que o problema do
executivo é ser profundamente incompetente. O programa real deste governo está
em curso com um enorme sucesso: o empobrecimento da população, o aumento do
desemprego são armas para conseguir a destruição de todos os direitos de quem
trabalha e conseguir um embaratecimento abrupto do custo da mão-de-obra.
A privatização de
tudo aquilo que é público e a destruição do Estado social são outros vértices
desta contra-revolução conservadora. Pretende-se esmifrar os contribuintes, os
trabalhadores e os reformados, e diminuir abruptamente a sua magra fatia no
rendimento nacional.
Os trabalhadores
que vivem em Portugal já eram daqueles que menos ganham na Europa e mais horas
trabalham. Agora passam a ganhar ainda menos e a trabalhar ainda mais.
Perante isto, uma
miríade de comentadores fala na necessidade de cortar nos “direitos
adquiridos”, naturalmente nunca se referindo à renegociação de contratos
desastrosos que vão entregar dezenas de milhares de milhões de euros dos
contribuintes às empresas que assinaram os contratos das parcerias
público-privadas. É bem visível que o governo produz desempregados
propositadamente. A crise é uma arma para dar mais aos muito ricos e tirar
muitíssimo a todos os outros.
O tempo histórico
da mudança é mais lento que a nossa vontade. Mas só tentando tomar os céus de
assalto é possível impedir este caminho. É este o exemplo dos operários da
Comuna para quem não quer viver de joelhos.
Editor executivo,
escreve à terça-feira
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