Eduardo Oliveira
Silva – Jornal i, opinião
Ninguém tem
legitimidade para chantagear mesmo subliminarmente os juízes do Tribunal
Constitucional
O mês que agora
começa promete ser dos mais tensos e difíceis dos últimos tempos. Além da
divulgação dos indicadores económicos habituais, e que se advinham péssimos,
além da moção de censura, além do início da actividade de Sócrates como
comentador, além da constatação dos mais pobres de que vão ter de declarar e
pagar IRS, há sobretudo a expectativa em relação às decisões do Tribunal
Constitucional.
Mas há um facto incontroverso. É nas mãos dos juízes que está muito do que se
vai passar a seguir, e vai condicionar a vida de todos os portugueses.
Desta vez não são os mercados, nem a troika, nem o BCE que nos dominam. É a
decisão de um órgão de soberania que pode mudar o quotidiano de forma súbita.
De qualquer maneira, uma coisa é certa: decidam o que decidirem, os portugueses
poderão discutir e opinar sobre as matérias antes e depois, mas nenhum tem
legitimidade para chantagear, subliminarmente que seja, os juízes antes de
decidirem.
É bom lembrar que os tribunais constitucionais existem em regra em países
saídos de ditaduras ou que têm tendência para ser dirigidos por oligarquias.
Existem para evitar atropelos a direitos absolutamente essenciais.
É por isso que as pressões prévias ou as atitudes intempestivas posteriores do
poder político são inadmissíveis, inadequadas, irresponsáveis e
antipatrióticas.
Governar em democracia (ocidental) é difícil. No entanto, quem se afirma
democrata tem de cumprir a lei fundamental e portanto deve à partida procurar
que os seus actos e decisões tenham como parâmetros os limites constitucionais,
sob pena de ficar fora do terreno democrático.
Quem governar procedendo anualmente de forma provocatória em relação à cartilha
essencial não tem condições éticas para exercer o poder e melhor seria
dedicar-se, por exemplo, ao mundo dos negócios e das operações financeiras, em
que hoje vale tudo, começando pela agiotagem que várias vezes sugou a Europa e
a levou a reacções violentas.
Dir-se-á que a Constituição está velha e obsoleta em alguns aspectos. Está. Mas
para a mudar é preciso procurar consensos dentro da Assembleia da República ou
então apresentar um programa ao eleitorado que concite o apoio de tantos
votantes que assegure dois terços dos lugares de deputados numa legislatura que
permita abrir um período de revisão normal. Ou, melhor ainda, ocupar quatro
quintos dos lugares e abrir uma revisão extraordinária.
Não é fácil? Pois não! Mas isso não legitima de modo nenhum a violação da lei
fundamental ou de princípios fundamentais da ética, seja ela republicana seja
monárquica.
Violar leis essenciais de forma deliberada e sistemática é um crime que se
assemelha a outros para os quais se pode usar a mesma palavra. Quem entra por
esse caminho sujeita-se a pagar penal ou eleitoralmente.
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