Verdade (mz),
editorial
Não nos enganemos.
O encontro que a Renamo exige ao partido no poder não visa, de forma alguma,
resolver o problema dos moçambicanos. O que, no nosso entender, está em causa é
o facto de apenas um dos intervenientes dos Acordos Gerais de Paz usufruir, exclusivamente,
dos recursos do país. Esse, na verdade, é o problema de fundo.
Portanto, não está,
repetimos, em causa a fome que assola 255 mil moçambicanos. Não está em causa a
falta de transporte e habitação. Não está, de forma alguma, em causa o
desemprego ou a transparência na gestão da coisa pública. Isso é um outro
problema e não fará, diga-se em tom alto, parte da agenda em discussão.
Não é estranha a
atitude da Renamo. Qualquer um, no lugar deles, depois de um negócio no qual se
sente beneficiado teria a mesma atitude e nem é isso que é reprovável. Essa
exigência é legítima pela forma como negociaram o futuro dos moçambicanos. Na
perspectiva de ambos os cidadãos desta nação nunca foram encarados como tal,
mas sim como propriedade, como gado, como corpos sem alma.
Nós não somos, de
forma alguma, sujeitos do nosso destino. Somos objectos da vontade de dois
ex-beligerantes. A terra, muito mais nossa do que deles, também é encarada da
mesma forma. É um mero objecto das suas vontades. Foi durante 16 anos e agora
reclamam os despojos de um povo martirizado nos últimos 37 anos.
A nossa pobreza, a
nossa nudez e o nosso desnorte não significam nada. O que importa é o dinheiro
que julgam que deve ser partilhado entre quadrilhas que delapidam
sistematicamente as nossas expectativas enquanto nação. Não é escola para o
filho do camponês de Cahora Bassa e nem um sistema de regadio para Chigubo. É
uma coisa bem diferente e muito mais macabra.
As vias do
desenvolvimento não fazem parte da agenda. Como vamos pagar a ponte para
Catembe, muito menos. Como a HCB, que faz dois milhões de dólares por dia, pode
beneficiar os moçambicanos, também é um assunto marginal.
Como vamos deixar
de ser o quarto pior país de mundo nem será, pelo menos, motivo de uma análise
superficial. Como vamos olhar para o Pro-Savana e proteger os camponeses, é uma
barbaridade de todo tamanho que não adianta discutir.
O que importa é
dividir o tacho. Retalhar o Orçamento Geral do Estado. Dividir os benefícios da
exploração da madeira e do carvão. É usufruir dos mesmos direitos e colocar
Afonso Dlhakama numa espécie de presidência aberta sombra de helicóptero.
Isso tudo para
exibir os músculos e lembrar aos moçambicanos a sua condição de escravos.
Portanto, em Gorongosa ou onde quer que seja ninguém vai falar de equidade e
justiça. O que importa, já o dissemos, é continuar a olhar para os moçambicanos
como o continente a ser dividido na mesa da conferência de Berlim que pretendem
montar em Gorongosa.
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