Henrique Monteiro –
Expresso, opinião em Blogues
A história é
triste, revoltante e comovente. É uma história de pobreza e de violência
judicial sobre os pobres. Passa-se em Sintra, onde um tribunal decide, em maio
de 2012, retirar sete filhos a uma mãe, cabo-verdiana, cabeleireira
desempregada. A Liliana, o seu nome, permitem-lhe ficar com as duas filhas mais
velhas.
Na sentença, que
deixou a mãe descoroçoada, mas sem saber o que fazer (ela nem sabia que ia para
um julgamento, e eu entendo-a, porque às vezes até eu tenho dificuldade em
perceber as cartas dos tribunais). Não há, na sentença, a prova de maus
tratos, de um delito que seja. Pelo contrário, o acórdão reconhece
que há afetividade entre os irmãos e entre mãe e filhos. Apenas se prova o
que é evidente - que Liliana é pobre. Num assomo da mais pura
desumanidade, a sentença refere que falta higiene que - meu Deus! - a luz
chegou a estar cortada por falta de pagamento! E que há um quarto para cinco
crianças! E que Liliana não laqueou as trompas e ainda teve mais filhos já
depois de a família começar a ser acompanhada pela assistência social.
Isto é para lá do
que Orwell escreveu no 1984. Para lá do Admirável Mundo Novo de
Aldous Huxley. Isto é bárbaro! É grotesco! Há dias, recordei um livro de
Jorge Luís Borges em que o protagonista, uma personagem que dirigira um campo
de concertação durante o nazismo, faz a seguinte reflexão: "O importante
é que reine a violência, não as servis timidezes cristãs. Se a vitória e
a injustiça e a felicidade não são para a Alemanha, que sejam para outras
nações". Não sei se o tribunal de Sintra partilha o ponto de vista...
Sei que gostava de
ter um nome forte para chamar a quem rouba filhos a uma mãe que os ama e é
amada por eles. Mas não me ocorre nenhum. Apenas espero que o processo não
acabe aqui e que aqueles que não sabem o que é a família, o amor e a
compaixão um dia peçam desculpa a Liliana.
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