Marta F. Reis –
Jornal i
Vendas bateram
recorde em 2012. Aumento de depressões pode não ser a única explicação, mas
todos os dias há casos ligados à crise
Em 2012 os
portugueses compraram em média 20 500 embalagens de antidepressivos por dia, um
número inédito desde que há registos. Os dados fornecidos ao i pela
consultora IMS Health revelam que as vendas destes medicamentos aumentaram 7,6%
ao longo do ano passado, resultando num total de 7,5 milhões de embalagens. Por
dia são mais 1469 que em 2011, ano em que os portugueses consumiram 6,9 milhões
de embalagens.
A literatura
científica aponta para uma forte relação entre os períodos de crise e subida do
desemprego e o aumento dos casos de depressão. Confrontada com esta subida,
Luísa Figueira, presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde
Mental e médica do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, reconhece que a crise,
podendo não explicar todo o aumento de consumo de antidepressivos, começa a ser
mais invocada nos diagnósticos. “Há mais depressões e casos de descompensação,
alguns claramente desencadeados pelo desemprego e por dificuldades económicas”,
conta a a chefe do serviço de psiquiatria de Santa Maria.
Embora não haja
dados nacionais, um mecanismo de triagem dos casos referenciados pelos médicos
de família para este hospital vai permitindo tirar algumas conclusões: “Passou
a ser frequente vir referido nos processos que o doente está deprimido por
dificuldades financeiras ou situações de desemprego na família. Não se pode
dizer que seja uma percentagem muito elevada, mas todos os dias aparecem casos
de depressões por razões de natureza económica. Há um ano isto não acontecia.”
Apesar de a relação
começar a consubstanciar-se de forma mais clara, para a especialista é preciso
cautela ao avaliar o aumento do consumo de remédios. Outros factores poderão
contribuir em simultâneo para esta tendência, explica, seja um aumento da
prescrição de medicamentos genéricos – por vezes com embalagens com menos
comprimidos e que podem motivar um maior número de unidades vendidas – seja o
facto de o preço dos remédios em geral ter vindo a cair. Os dados da IMS Health
confirmam que, apesar de existir um aumento das embalagens vendidas, os custos
diminuíram. Em 2012 as vendas de antidepressivos totalizaram 86 milhões de
euros. Em 2011, com menos embalagens vendidas, a factura foi superior 14%,
rondando os 100 milhões de euros. Os dados da consultora permitem ainda
concluir que o aumento das vendas se verificou ao longo de todo o ano. A maior
subida aconteceu ainda assim em Outubro, altura em que se venderam mais 100 mil
embalagens que no mesmo mês em 2011 (+17%).
NOVOS DADOS EM 2012
A
evolução do consumo de antidepressivos, embora não permita determinar com rigor
os factores na sua origem, é o único dado disponível quase em tempo real para
tentar perceber a evolução dos casos de depressão. As estatísticas do Infarmed,
com informação actualizada até Novembro, apontam para uma taxa de crescimento
semelhante (7,7%). Faltam mais dados, reconhece Luísa Figueira, que defende que
esse deve ser o caminho, ponderando a prescrição dos médicos e fazendo uma
monitorização nacional dos casos referenciados. “Poderia ajudar na planificação
dos cuidados. Não podemos mudar as condições económicas das pessoas mas temos
de nos preparar para dar cada vez mais apoio a estes doentes”, defende.
Por agora, o único
estudo nacional sobre a incidência da depressão em Portugal data de 2010 e
ainda não foi divulgado na íntegra. Com base numa amostra representativa da
população, os investigadores verificaram que Portugal tinha das taxas mais
elevadas de doenças mentais da Europa (23% dos portugueses tinha sido
diagnosticado com algum tipo de perturbação nos 12 meses anteriores e a
prevalência ao longo da vida superava os 40%). A incidência da depressão
fixou-se nesse ano nos 7,9%, só atrás das síndromes de ansiedade. José Caldas
de Almeida, director da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de
Lisboa e co-autor do trabalho, adiantou ao i que os resultados de 2010
deverão ser publicados na íntegra neste trimestre, adiantando que os
investigadores estão a tentar garantir financiamento para levar a cabo um novo
inquérito.
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