sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

PORTUGUESES COMPRARAM 20 MIL EMBALAGENS DE ANTIDEPRESSIVOS POR DIA




Marta F. Reis – Jornal i

Vendas bateram recorde em 2012. Aumento de depressões pode não ser a única explicação, mas todos os dias há casos ligados à crise

Em 2012 os portugueses compraram em média 20 500 embalagens de antidepressivos por dia, um número inédito desde que há registos. Os dados fornecidos ao i pela consultora IMS Health revelam que as vendas destes medicamentos aumentaram 7,6% ao longo do ano passado, resultando num total de 7,5 milhões de embalagens. Por dia são mais 1469 que em 2011, ano em que os portugueses consumiram 6,9 milhões de embalagens.

A literatura científica aponta para uma forte relação entre os períodos de crise e subida do desemprego e o aumento dos casos de depressão. Confrontada com esta subida, Luísa Figueira, presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental e médica do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, reconhece que a crise, podendo não explicar todo o aumento de consumo de antidepressivos, começa a ser mais invocada nos diagnósticos. “Há mais depressões e casos de descompensação, alguns claramente desencadeados pelo desemprego e por dificuldades económicas”, conta a a chefe do serviço de psiquiatria de Santa Maria.

Embora não haja dados nacionais, um mecanismo de triagem dos casos referenciados pelos médicos de família para este hospital vai permitindo tirar algumas conclusões: “Passou a ser frequente vir referido nos processos que o doente está deprimido por dificuldades financeiras ou situações de desemprego na família. Não se pode dizer que seja uma percentagem muito elevada, mas todos os dias aparecem casos de depressões por razões de natureza económica. Há um ano isto não acontecia.”

Apesar de a relação começar a consubstanciar-se de forma mais clara, para a especialista é preciso cautela ao avaliar o aumento do consumo de remédios. Outros factores poderão contribuir em simultâneo para esta tendência, explica, seja um aumento da prescrição de medicamentos genéricos – por vezes com embalagens com menos comprimidos e que podem motivar um maior número de unidades vendidas – seja o facto de o preço dos remédios em geral ter vindo a cair. Os dados da IMS Health confirmam que, apesar de existir um aumento das embalagens vendidas, os custos diminuíram. Em 2012 as vendas de antidepressivos totalizaram 86 milhões de euros. Em 2011, com menos embalagens vendidas, a factura foi superior 14%, rondando os 100 milhões de euros. Os dados da consultora permitem ainda concluir que o aumento das vendas se verificou ao longo de todo o ano. A maior subida aconteceu ainda assim em Outubro, altura em que se venderam mais 100 mil embalagens que no mesmo mês em 2011 (+17%).

NOVOS DADOS EM 2012 

A evolução do consumo de antidepressivos, embora não permita determinar com rigor os factores na sua origem, é o único dado disponível quase em tempo real para tentar perceber a evolução dos casos de depressão. As estatísticas do Infarmed, com informação actualizada até Novembro, apontam para uma taxa de crescimento semelhante (7,7%). Faltam mais dados, reconhece Luísa Figueira, que defende que esse deve ser o caminho, ponderando a prescrição dos médicos e fazendo uma monitorização nacional dos casos referenciados. “Poderia ajudar na planificação dos cuidados. Não podemos mudar as condições económicas das pessoas mas temos de nos preparar para dar cada vez mais apoio a estes doentes”, defende.

Por agora, o único estudo nacional sobre a incidência da depressão em Portugal data de 2010 e ainda não foi divulgado na íntegra. Com base numa amostra representativa da população, os investigadores verificaram que Portugal tinha das taxas mais elevadas de doenças mentais da Europa (23% dos portugueses tinha sido diagnosticado com algum tipo de perturbação nos 12 meses anteriores e a prevalência ao longo da vida superava os 40%). A incidência da depressão fixou-se nesse ano nos 7,9%, só atrás das síndromes de ansiedade. José Caldas de Almeida, director da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa e co-autor do trabalho, adiantou ao i que os resultados de 2010 deverão ser publicados na íntegra neste trimestre, adiantando que os investigadores estão a tentar garantir financiamento para levar a cabo um novo inquérito.

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