segunda-feira, 15 de abril de 2013

Portugal: CHEGOU O MOMENTO, SENHOR PRESIDENTE!




Nuno Peres Monteiro – Jornal i, opinião

É preciso renegociar a dívida, por uma razão muito simples: é impossível Portugal pagar o que deve nos termos em que o deve

1. Não é a decisão do TC que causa o falhanço do governo, que já se tinha mostrado incapaz de cumprir os objectivos do Memorando de entendimento com a troika e de fazer as necessárias reformas estruturais desde muito antes de o TC ter inviabilizado o presente orçamento. O actual governo falhou por não ter tido a coragem política de fazer reformas, tal como demonstra a parte mais patética do discurso do primeiro-ministro reagindo ao acórdão do TC, onde, para além de alijar todas as responsabilidades para os juízes, diz ir agora - agora, dois anos depois de ter começado a governar - estudar reformas mais profundas.

2. A decisão do TC não deixa por isso de ser uma interpretação, a meu ver restritiva, da Constituição, que pode, no entanto, ter por efeito obrigar Portugal a avançar rumo a reformas propriamente ditas em vez da austeridade salarial e fiscal que tem vindo a ser imposta, com desastrosos resultados económicos e sociais.

3. O problema é que fazer reformas estruturais agora será muito difícil porque o tempo político deste governo está praticamente esgotado e a sua antagonização do PS desde o início do seu mandato levou a que a liderança socialista adoptasse um tom crescentemente crispado, que hoje roça o histriónico.

4. O caminho menos horrivelmente difícil para Portugal continua a ser o das reformas estruturais, incluindo reduções muito substanciais do peso dos salários e contribuições sociais na despesa pública, o que só se conseguirá com diminuições do número dos que trabalham para o Estado e com a racionalização das prestações sociais de modo a que estas se centrem em quem não pode prescindir delas para sobreviver e não na classe média.

5. Ao mesmo tempo é preciso renegociar a dívida, por uma razão muito simples: é impossível Portugal pagar o que deve nos termos em que o deve. Isto exigirá uma postura por parte do governo português mais frontal em relação aos nossos credores, postura essa que tenho dúvidas o actual primeiro-ministro saiba ou queira adoptar.

6. Significa tudo isto que cada vez mais a governação de Portugal exige consensos alargados enquanto o sistema partidário e a própria sociedade estão - em consequência, por um lado, da inépcia governamental em realizar reformas e comunicar aos portugueses uma estratégia viável e, por outro, do profundo populismo assumido por toda a oposição - crescentemente fracturados.

7. Assim sendo, e num quadro que me parece já configurar um irregular funcionamento das instituições democráticas por não conseguirem estas gerar os consensos essenciais à manutenção da soberania nacional, chegou a altura de o PR investir o seu (hélas, reduzido) capital político, na criação desse entendimento através da formação de um governo de iniciativa presidencial.

8. Tal governo, para o qual seria possível angariar personalidades provenientes de todo o arco governativo, incluindo a área socialista, deveria imediatamente constituir uma “comissão de sábios” que determine onde e como vamos cortar os tais 4 ou 5 mil milhões de euros na despesa pública de uma forma que maximize a competitividade e, assim, a nossa capacidade de crescimento e, por isso, também de redestribuição. Tal estudo, que deveria já ter sido feito de uma forma socialmente abrangente, daria também ao governo um acrescido poder negocial junto da troika no sentido de renociar prazos e taxas de juro da nossa dívida pública.

9. Este cenário, não sendo o ideal, é, como diria Churchill, preferível a todas as outras alternativas que, no fundo, são apenas duas. A primeira é a manutenção de um governo debilitado quer na sua capacidade de implementar reformas quer, consequentemente, na sua capacidade de renegociar a dívida. A segunda é a convocação de eleições de que resultaria a vitória de um PS com a liderança mais populista de que há memória, que não acha serem necessárias quaisquer decisões difíceis e que teria uma ainda mais reduzida capacidade negocial na Europa porque qualquer cedência da troika a esta liderança socialista seria premiar quem não quis ajudar o actual governo a cumprir o Memorando. Qualquer destas possibilidades resultaria na continuação da degradação do funcionamento das nossas instituições políticas, aumentando o risco de termos de sair do euro e, pior ainda, virmos a ter um outro tipo de regime, de legitimidade democrática ainda menos expressiva do que um governo de iniciativa presidencial, como aliás tivemos durante quase metade do século passado em resultado do colapso do processo político da primeira república.

10. Em resumo, chegou o momento, Senhor Presidente!

Professor de ciência política na Universidade de Yale

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