terça-feira, 19 de novembro de 2013

Portugal: A ABOMINÁVEL MENSAGEM DO DR. CÉSAR DAS NEVES

 

Eduardo Oliveira Silva – jornal i, opinião
 
Como é possível achar uma catástrofe o salário mínimo chegar aos quinhentos euros?
 
Não é tanto aquilo que João César das Neves diz que arrepia; é a forma como o exprime. Este católico, que foi um precioso auxiliar de governante e um alto quadro da época do dinheiro para tudo, transmite hoje em dia uma severa e castigadora mensagem com um olhar fulminante que mais lembra o de um fundamentalista.
 
César das Neves recorre ao "sound bite" sistemático para propalar a partir da sua cátedra o que acha serem verdades para fazer escola, mas não se lhe ouve um acto de contrição por ter sido parte de escolhas que mandaram para casa trabalhadores em plena idade produtiva para libertar as empresas à conta da Segurança Social, engrossando lucros e balanços para facilitar privatizações altamente rentáveis. E isso aconteceu quando ele era um consultor influente do governo, quadro do Banco de Portugal, onde teve, também ele, um poiso e um regaço cumulativo.
 
Com tanta bagagem, tanta ciência e tanto mestrado, não há, porém, nota dele na economia real e verdadeira das empresas. Mesmo assim, fala sobre o que seria uma catástrofe nacional se o salário mínimo chegasse aos astronómicos quinhentos euros, quando, por exemplo, na Irlanda é cerca de três vezes mais.
 
Como não podia deixar de ser, César das Neves, numa elucidativa entrevista ao "Diário de Notícias", atira-se também ao Tribunal Constitucional, com o hilariante argumento de que não faz análises jurídicas mas políticas. Ora se a Constituição é uma lei política, como seria possível fazer leituras que não envolvessem considerações sobre direitos e questões de igualdade?
 
No seu discurso, o professor diz também muitas coisas certas, mas sente-se nele uma permanente necessidade de se afirmar como quem procura seguidores ou até criar escola, através de proclamações bombásticas e fulgurantes, como a de que "subir o salário mínimo é a melhor maneira de destruir a vida dos pobres", ou de que "há uma data de gente a falar de pobres que não são pobres e que em nome dos pobres querem defender o seu, a fingir que são pobres".
 
Pobres os que usam uma linguagem dessas, isso sim! Pobres porque não percebem que há uma classe média que trabalhou fora da universidade, do Banco de Portugal e dos gabinetes governamentais cumprindo ao longo de anos horários e deveres e que hoje em dia tem medo do futuro ou do empobrecimento para o qual a estão a empurrar irremediavelmente. O que essa gente recebe como salário é contrapartida de trabalho e esforço efectivo. Quanto aos que são pensionistas e vão tendo algum conforto mas estão preocupados e por isso falam publicamente, é bom lembrar que recebem em função de descontos efectuados em concreto por eles próprios e pelas empresas para as quais trabalharam.
 
Quando se ouvem afirmações peremptórias e absolutas proferidas por alguns católicos, percebem-se perfeitamente os problemas que enfrenta o Papa Francisco e a dificuldade que vai sentir para tornar mais consensual e actualizada a mensagem da Igreja. Esperemos que o Santo Padre tenha êxito.
 

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