João Marcelino –
Diário de Notícias, opinião
1. O Governo tomou
o freio fiscal nos dentes. Corre à desfilada. Cá dentro, suscita medo e
revolta. E, curiosamente, vindo de fora ouve Durão Barroso afirmar que as
políticas nacionais são da responsabilidade dos respetivos governos e Christine
Lagarde aconselhar mais dois anos para o ajustamento orçamental português.
Nada que
impressione quem se julga imbuído da divina missão de salvar o País, custe o
que custar. Doa a quem doer. Acredite quem acreditar. Resista a economia o que
resistir. Sofram as pessoas o que sofrerem.
O Governo com este
orçamento fiscal está a ir perigosamente longe de mais. Divorcia-se do País e
delapida definitivamente o consenso social que nos permitiu percorrer com
conformismo os últimos meses.
Pedro Passos Coelho
e Vítor Gaspar estão a colocar Portugal à beira de uma revolta social. Podem
julgar que isso é coragem e determinismo histórico. Mas não. É apenas autismo e
insensibilidade social.
2. Convém
relembrar: há um ano havia um amplo consenso na sociedade nacional. O PS,
envergonhado, tinha acertado os termos do resgate financeiro. Os portugueses
que acreditam na União Europeia e no euro (ou seja, neste projeto político e
social que ontem recebeu a bênção do Nobel da Paz num momento particularmente
dramático da sua construção) estavam conscientes das dificuldades. Porque são
sérios, queriam - e querem - pagar as dívidas. Sabiam que havia que encolher
orçamentalmente, apertar o cinto para pagar anos de descontrolo do Estado e
roubos como o BPN. Entregaram-se, pois, conscientemente a um período
necessariamente longo de austeridade. Partidos, parceiros sociais, patrões e
trabalhadores (com a CGTP, o PCP e o BE sempre de fora, como é hábito)
comungavam todos a mesma visão de um país honrado.
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