quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Cabo Verde: 14 FAMÍLIAS PASSAM PRIVAÇÕES POR INÉRCIA DO TRIBUNAL DE ASSOMADA





Assim vai a Justiça em Cabo Verde…

Há mais de 7 anos que Luís António Martins aguarda a reparação de danos causados por acidente que mandou para a sucata uma embarcação de pesca que dava de comer a 14 famílias. Juíza do processo, não ata nem desata…

Praia, 23 de Novembro 2011 – Luís António Martins é um homem amargurado. Armador e proprietário de embarcação de pesca costeira – sem grande préstimo, como adiante se verá -, Luís não consegue esquecer o dia que lhe mudou a vida e o fez passar, subitamente, de algum desafogo financeiro para uma situação de dificuldades crescentes e sem fim à vista.

Toda uma vida dedicada à pesca, fez de Luís António, nado e criado em Ribeira da Barca, um experimentado homem do mar e, de tal modo conhecia os segredos do oceanos e as contingências do pescado que, sem hesitar, resolveu contrair empréstimo bancário e tornar-se proprietário de embarcação própria, investindo no sustento de sua família e de mais 13 marinheiros.

“Ponta Norte”, a traineira de Luís, foi, durante anos a alegria da terra, não só por dar pão a 14 famílias, mas por razão de ser a embarcação que mais peixe levava ao porto desta acolhedora terra piscatória do concelho de Santa Catarina de Santiago. E assim foi até ao fatídico dia 23 de Março de 2004 quando, sabe-se lá vinda de onde – mas envolvida em pormenores no mínimo repugnantes -, uma outra embarcação, a “Carlos Lopes”, navegando em direcção a Porto de Angra abalroou a “Ponta Norte”, causando-lhe dano profundo que veio a impedi-la de se fazer, de novo, ao mar.

E, como uma desgraça raramente vem só, mais tarde se soube que, não só o piloto da “Carlos Lopes” não estava habilitado para se fazer ao mar, por inexistência de qualquer carta de “mestre”, como também a embarcação não estava segurada, como é de lei.

Recolhida a embarcação, por determinação da companhia de seguros de Luís António, para doca seca em Praia Negra, na cidade da Praia, até que se apurasse a cargo de quem ficaria a reparação, apresentada a queixa respectiva, apenas cinco anos depois o caso foi a tribunal, onde foi determinada a condenação do arguido, em processo crime, ao cumprimento de uma pena de prisão substituível por multa que, aliás, passado todo este tempo nunca liquidou, nem tão pouco, apesar de informação remetida a tribunal pela mandatária do lesado, cumpriu a pena de 120 dias de prisão efectiva a que fora condenado.

COMEÇA O CALVÁRIO…

Pelo rigor do relato e pela importância documental de que se reveste – valerá a pena um passar de olhos pelo acórdão de sentença que retrata as circunstâncias do acidente – como se percebe, longe de ser acidental.

“Ao amanhecer, por volta das seis horas do dia 23 do referido mês e ano, a tripulação da embarcação ‘Ponta Norte’ lançou rede ao mar na tentativa de cercar peixes que ali encontrassem.

“Momentos depois, surgiu a embarcação ‘Carlos Lopes’ e a respectiva tripulação a navegar em direcção ao Porto de Angra, local onde a tripulação da embarcação ‘Ponta Norte’ andava a pescar.

“Começou a navegar, em alta velocidade, lado a lado, com a embarcação ‘Ponta Norte’ numa vã tentativa de apanhar peixes que haviam sido localizados pela embarcação Ponta Norte’.

“O queixoso, Luís Martins, advertiu prontamente a tripulação da embarcação ‘Carlos Lopes’ e o arguido que se afastassem da sua embarcação, visto que poderia resultar choque entre as duas embarcações.”

O relato, com a precisão do rigor jurídico, dispensando, por tal, a maestria de aprimorar literário, traduz bem as circunstâncias que antecederam o acidente, provocado por maldade, inveja e ganância de quem, aproveitando-se da labuta alheia, pretendia ganho garantido sem qualquer esforço.

O arguido, seguramente alguém com muito mau carácter, despeitado por não lhe permitirem os intentos, afastou-se, ganhando balanço e, a alta velocidade, direccionou à ‘Ponta Norte’, abalroando-a e causando um prejuízo, a preços da época, de dois milhões oitocentos e sessenta mil escudos (2.860.000$00), para além de privar, até hoje, treze homens de auferirem salários médios de 30 mil escudos mensais.

Como já se disse, de nada serviu a Luís Carlos a condenação do arguido, até porque mesmo que venha a ser preso, a embarcação continua parada – e, neste momento, já irreparável -, o pão diário de sua família foi roubado de um repente, a vida de seus empregados empurrou-os para o desemprego, e nem mesmo a sua companhia de seguros (a Ímpar) quer assumir responsabilidades, alegando que o arguido não tinha carta… Como se Luís tivesse culpa disso, como se ele próprio tivesse sido responsável pelo acidente.

E, mais ainda, sem meios de sustento, Luís Carlos Martins colocou-se numa situação de incumprimento perante a entidade bancária que lhe emprestou o dinheiro para comprar “Ponta Norte”.

Entretanto, corre desde 2009 um processo cível contra o arguido, o proprietário de ‘Carlos Lopes’ e a companhia de seguros, a quem Luís acusa de não cumprir com as suas responsabilidades contratuais.

O processo arrasta-se na pasmaceira funcional do Tribunal de Assomada, tendo já passado por vários juízes e, apesar de há mais de um ano ter sido efectuada a audiência preparatória, aguarda os trâmites tidos por convenientes e ao sabor do arbítrio de um único magistrado, neste caso uma juíza, que apesar das promessas nunca mete mãos ao processo…

Senhora juíza, se não fora por outras razões, ao menos cuide deste caso pela urgência de que se reveste a miséria imposta a 14 famílias de Ribeira da Barca. Será pedir muito, meritíssima? Ainda para mais em tempo de crise… internacional?! É que a Justiça, para o ser integralmente, tem de ser justa.

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