domingo, 25 de novembro de 2012

Portugal – Estado Social: Meta de quatro mil milhões é “insanidade financeira”

 

Rádio Renascença
 
“Colocar a meta do corte dos 4 mil milhões de euros apenas no Estado Social, e não em outras áreas da despesa pública, é um exemplo de insanidade financeira” defendeu a ex-presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, num debate promovido pela Renascença à margem da Semana Social 2012 que encerrou este domingo na Casa de Vilar, no Porto.

A economista sustenta que se está a adulterar a discussão sobre o futuro do Estado Social quando os recursos financeiros são a prioridade. “Enquanto não formos capazes esta distinção muito clara entre objectivos [repensar o Estado Social] e recursos, estamos numa armadilha porque nos vão dizer que é fatal cortar 4 mil e 500 milhões de euros e, imediatamente a seguir, nos dizem que vão ser cortados no Estado Social” afirma a presidente do Grupo Economia e Sociedade.

“Não estamos convocados para discutir o Estado Social numa base pura, numa base de verdade. Estamos convocados para aceitar um conjunto de cortes em nome de que é preciso encontrar 4 mil milhões de euros” indica Manuel Carvalho da Silva, professor universitário e nome histórico do sindicalismo português.

Já Isabel Jonet acentua a necessidade de reavaliar o modelo de financiamento do conjunto de direitos básicos fundamentais.

“Não sei se o ajustamento deve ser feito pelo lado da receita ou pelo lado da despesa. Acho que há um conjunto de direitos básicos que não poderá nunca deixar de ser garantido. O que não gostaria de ver era o Estado Social ameaçado. Para podermos assegurar esse Estado Social temos, se calhar, de repensar o seu modelo de financiamento” acrescenta a presidente do Banco Alimentar.

Rever o memorando

“O memorando terá de ser revisto, porque quem rubricou o acordo não teve a percepção do desajuste entre as exigências e o país real. Não temos condições de as cumprir, sob pena de estarmos a infligir sacrifícios sobre-humanos às pessoas que seguramente não contribuíram decisivamente para a situação em que estamos” é a tese de Eugénio da Fonseca, o presidente da Cáritas.

Num período de crise aguda em que a sociedade portuguesa não consegue criar riqueza suficiente para redistribuir pelo conjunto da sociedade, Isabel Jonet defende também um diálogo alargado com a máxima serenidade possível.

“Talvez haja na sociedade portuguesa uma incapacidade de diálogo verdadeiro e lúcido, até por causa destas pressões que são colocadas. Um diálogo com essas características tem de surgir até para estarmos todos mobilizados e conscientes de que dependemos de todos e temos de estar empenhados na mudança. Quando há pobreza, este é um tema que nos interessa, porque diz respeito a todos. Não podemos ficar indiferentes” acentua a presidente do Banco Alimentar.

Regulação global

No plano externo, a professora Manuela Silva sustenta que a regulação da economia mundial tem falhado.

“Os mercados são necessários, mas não se auto-regulam e isto é importante que seja dito. Tem de haver estruturas que possam introduzir alguma regulação e, sobretudo, que possam recolocar as finanças ao serviço da economia e a economia ao serviço das pessoas e do bem comum” refere a presidente do Grupo Economia e Sociedade da CNJP.

Também Manuel Carvalho da Silva sublinha a premência de valores básicos como a solidariedade reafirmada por fenómenos recentes como o furacão Sandy.

“Nova Iorque, a capital do sistema sofreu o mesmo que sofreria a capital de um país menos desenvolvido e as respostas passaram pelo recurso ao Estado e, sem hesitação, a imposição de valores colectivos, de solidariedade colectiva. A actuação do mayor Bloomberg é até um grande exemplo. Ou seja, são múltiplos os casos da vida a demonstrar que não podemos caminhar para esta ideia prevalecente do individualismo”, conclui o sociólogo.

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