Daniel Oliveira –
Expresso, opinião, em Blogues – 04.12.2012
O primeiro-ministro
está a começar a ficar tão habituado às suas contradições e mentiras que já
tropeça nelas e nem dá por isso.
Disse, na
entrevista à TVI: "Temos uma Constituição que trata o esforço do lado da
Educação de uma forma diferente do esforço do lado da Saúde. Na área da
Educação, temos alguma margem de liberdade para poder ter um sistema de
financiamento mais repartido entre os cidadãos e a parte fiscal direta que é
assumida pelo Estado." Um financiamento mais repartido entre os cidadãos e
a parte fiscal direta (dos contribuintes, que por acaso são os mesmíssimos
cidadãos) não quer dizer co-pagamento?
O primeiro-ministro
acha que não. Disse, logo depois da entrevista: "Eu nunca fiz qualquer
referência a essa matéria e posso mesmo dizer que isso nem tem qualquer
sentido. De resto, o senhor ministro da Educação esclareceu-o muitíssimo bem.
Não é possível, em termos de ensino obrigatório, criar taxas dessa natureza."
Fica o mistério: o que quer dizer "repartir os custos"?
Alguns têm
defendido que o problema de Pedro Passos Coelho é de comunicação. Que, nas
entrevistas, improvisa. E saem-lhe estas pérolas que logo depois tem de
desmentir. Parece-me uma avaliação bondosa. Poderia ter alguma credibilidade se
esta referência fosse inédita. Mas não é.
Num artigo
publicado no jornal "I", em 2010, logo depois de chegar à liderança
do PSD, Passos Coelho escreveu: "É indispensável organizar um ambicioso
programa de combate aos desperdícios nas políticas públicas mais pesadas, como
são a Saúde e a Educação, fundadas na melhoria da nova gestão pública, no
incentivo à livre escolha e na introdução de co-pagamentos pelos serviços
prestados, com salvaguarda dos mais desfavorecidos." Os co-pagamentos que
agora não fazem qualquer sentido e não são possíveis.
Com estes factos, e
tentando repor alguma ordem nas contradições de Passos Coelho, era de
co-pagamentos que o primeiro-ministro estava mesmo a falar. Porque já o tinha
dito antes, com todas as letras, e porque é a única interpretação possível das
suas palavras na entrevista da TVI. Que tenha sentido a necessidade de o
desmentir logo depois, compreende-se pela reação generalizada à proposta. O
País ainda não está preparado. É esperar pelo desastre a que os primeiros meses
da aplicação do seu orçamento nos levarão para poder dizer: "nós nem
queríamos, mas agora temos de cortar na despesa". O problema é que sabemos
que queriam. Nunca quiseram outra coisa.
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