quarta-feira, 23 de outubro de 2013

CASTIGO AOS RESPONSÁVEIS DA CRISE

 


Benjamim Formigo – Jornal de Angola, opinião - 21 de Outubro, 2013
 
Antes de tudo o mais, o JP Morgan foi o banco norte-americano que em 2008 contribuiu decisivamente para a maior crise financeira e económica do pós-guerra. O JP Morgan desencadeou a crise e lucrou com ela.
 
Três semanas depois de o Governo federal ter encerrado, por falta de dinheiro, e na mesma semana em que a Casa Branca conseguiu dos republicanos ultraconservadores um acordo temporário, para poder assumir os seus compromissos financeiros e reabrir as portas dos serviços, a Administração obteve, também, uma importante vitória sobre Wall Street.

O Departamento de Justiça e o JP Morgan chegaram a um acordo extrajudicial que anula os processos civis contra o maior banco dos Estados Unidos, obrigando-o a pagar 13 mil milhões de dólares em multas e indemnizações a consumidores prejudicados por falsas informações sobre produtos financeiros tóxicos colocados pelo JP Morgan no mercado.

Tal como o entendimento com os republicanos sobre o limite da dívida e o orçamento foi conseguido no último momento, o acordo com o banco surgiu numa excelente sequência temporal para Barack Obama, que daqui a meses tem de enfrentar de novo o Congresso para manter o país a funcionar. A opinião pública, desde a crise de 2008, exigia da Administração um maior controlo sobre Wall Street e a penalização dos responsáveis pela crise financeira dos “subprimes” que desencadeou uma crise económica de repercussões mundiais, e que ainda não desapareceu.

O acordo de princípio entre a administração do banco e o Departamento de Justiça foi rubricado na sexta-feira passada, estando, contudo, dependente do grau de culpabilidade que o JP Morgan está disposto a assumir. A indemnização de 13 mil milhões de dólares constitui um entendimento sem precedentes. Nunca uma empresa pagou uma quantia tão elevada em multas e compensações ao Estado e a entidades públicas e privadas prejudicadas pela sua acção e comportamento. A admissão de culpabilidade ou de mau procedimento é, contudo, inevitável, e o banco irá procurar que o documento minimize as suas responsabilidades, ou mesmo as omita. Se assim não for, o JP Morgan paga os 13 mil milhões de dólares, mas mantém a sua exposição a novos processos civis de accionistas ou outros que se possam sentir prejudicados pela acção do banco.

Por outro lado, o entendimento com o Departamento de Justiça inclui apenas os casos do foro civil, não extinguindo a meia dezena, pelo menos, de investigações e casos crime em que o banco está a ser investigado pelas autoridades federais e estaduais, incluindo acusações de alegada manipulação das taxas interbancárias Libor e dos mercados de energia da Califórnia e outros estados do Midwest.

Se o acordo preliminar a que o banco e o Governo federal chegaram não se concretizar, Washington não hesitará e a máquina federal cairá em cima do banco, desenterrando tudo quanto já tem e possa vir a encontrar, e até – caso raro – as autoridades federais irão colaborar com as estaduais para sentarem o JP Morgan no banco dos réus. De acordo com o sistema americano de Justiça, o julgamento é decidido por um júri, representantes de uma opinião pública pouco favorável aos bancos. Todavia, a decisão do júri tem de ser unânime e basta que, para um membro do júri, a prova não seja feita para além de dúvidas razoáveis para a absolvição. O JP Morgan tornou-se um exemplo para os que no futuro se possam sentir tentados a manipular os mercados. Não é de esperar que esteja na disposição de se arriscar perante um júri sequestrado pelas autoridades estaduais ou federais, ou as duas, durante todo o julgamento.

Entretanto, os republicanos procuram uma forma de se livrarem ou reduzirem a influência do “tea party”, que lhes está a custar popularidade e a retirar a credibilidade de partido de Governo. O radicalismo do “tea party” não é o conservadorismo ideológico de Newt Gingrich, e os votos que trouxe no passado estão em risco de colocar o GOP (Great Old Party, nome tradicional dos republicanos) numa posição delicada. Conseguir controlar os “rebeldes” ultraconservadores é uma tarefa homérica para o líder republicano da Câmara dos Representantes. Mas é evidente a necessidade de fazer regressar a política de consenso bipartidário que sempre caracterizou os Estados Unidos, e fazê-lo antes de Fevereiro.

Os mercados que ainda não reagiram ao JP Morgan, mantendo estável o valor das suas acções, mesmo depois de conhecido o acordo preliminar, estão retraídos relativamente à economia americana, por causa da precariedade do acordo conseguido. O dólar continua a descer, causando perdas de rendimentos na economia mundial e, em especial, nos países fornecedores de matérias primas. O comércio mundial faz-se em dólares dos Estados Unidos e os exportadores recebem cada vez menos, sobretudo no sector da energia, onde a procura caiu, e pode cair ainda mais, impedindo ou travando uma subida dos preços das matérias primas.

O JP Morgan constitui um exemplo. Com a sua dimensão gigantesca, a influência no mercado e as práticas menos correctas foi decisivo no desencadear de uma crise em 2008. Essa crise perdura passados cinco anos. Mas acalmem-se os neoliberais. A regulamentação ainda está a algumas crises de distância.

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