quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

BRASIL | Lula: Quatro hipóteses sobre o último Datafolha


Lula cresce: intocado em meio ao bombardeio, encarnou o anti-golpe. Vem aí uma nova disputa pelo “centro”; Huck pode voltar. Força de Ciro sugere articulação contra retrocessos

Antonio Martins | Outras Palavras

I. Saiu nesta madrugada (31/1) uma nova pesquisa Datafolha, de intenção de voto para a Presidência. Os resultados revelam, antes de tudo um fenômeno político extraordinário. Lula sofreu, a partir de quarta-feira passada (24/1), o bombardeio mais intenso lançado contra um político ao menos desde o fim da ditadura. Condenado pelo TRF-4 em jogo de cartas marcadas, foi dado por toda a mídia como candidato liquidado, à porta da prisão (“à beira do precipício”, segundo Veja). Resistiu sem um arranhão, revela a enquete, realizada no início desta semana (29 e 30/1). Mantém o mesmo patamar (entre 34% e 37% dos votos, dependendo dos adversários) do levantamento anterior.

Só um fenômeno explica este resultado. O ex presidente tornou-se imune aos ataques que lhe são lançados pelo Judiciário, os políticos conservadores e a mídia – ou seja, pelo bloco de forças políticas que consumou o golpe de 2016. É como se uma vasta fatia do eleitorado, que sente na pele o efeito dos retrocessos, desqualificasse o bombardeio, por compreender (ou intuir) os interesses que há por trás dele.

Este fato tende a provocar, nas próximas semanas, forte tensão política. Uma impugnação da candidatura de Lula só poderá ocorrer em setembro – e mesmo sua possível prisão de Lula, em dois meses. O ex-presidente parece ter percebido que, desafiado pelos adversários e deixado sem outra saída, só tem futuro se dobrar a aposta. Anuncia que criará fatos políticos de grande relevância: entre eles, novas caravanas pelo país e o lançamento, em algumas semanas, de uma nova Carta aos Brasileiros, dirigida às maiorias que reclamam direitos, e em particular às classes médias. Num ambiente de crise social, este aceno de mudanças tende a repercutir com intensidade. Obrigará os adversários a uma tentativa de defesa, difícil e desgastante. E a prisão de Lula será vista como vingança da elite, como tentativa de calar quem se opõe às injustiças. Se o candidato executar, de fato, o que tem prometido, criará condições para manter a candidatura inclusive encarcerado – em desafio aberto à coalizão jurídico-midiática.

II. Um segundo fenõmeno captado pela pesquisa dificulta a situação do bloco do conservadorismo tradicional. Não há aí, segundo o Datafolha, nenhum sinal de que esteja se formando uma liderança clara, capaz de articular iniciativas comuns. A festejada candidatura de Geraldo Alckmin não decolou: atinge no máximo 6% das preferências, nos cenários com Lula. Nota importante: Michel Temer (1%) e Henrique Meirelles (1%), os principais executores da agenda de retrocessos (em especial da contrarreforma da Previdência), são vastamente rejeitados. É um sinal que deverá perturbar deputados e senadores e tornar mais difícil a aprovação de uma emenda constitucional que mídia e aristocracia financeira tentam vender como “indispensável”. Há cheiro de nova derrota à vista, para o bloco conservador.

Este cenário tende a incentivar a candidatura de Luciano Huck. Em dois artigos recentes, Fernando Henrique Cardoso incentivou-a, de modo mais ou menos explícito. O apresentador, que retirou-se provisoriamente da disputa há dois meses, aparece, ainda assim, com os mesmos 6% de Alckmin. Ainda assim, nada indica que o governador de São Paulo, ou mesmo Henrique Meirelles, estejam prontos a se retirar da disputa – o que ampliará o desconforto entre o campo conservador.

III. Mesmo nos cenários sem Lula, as intenções de voto de Manuela Dávila-PCdoB (3%), Jacques Vagner-PT (2%) e Guilherme Boulos (1%) são reduzidas. Mas salta aos olhos a persistência de Ciro Gomes-PDT. Nos cenários com Lula, ele tem 7%; sem o ex-presidente, até 13%.

Para o momento, a estratégia de Lula – manter a candidatura, mesmo perseguido ou preso – está se mostrando extremamente sagaz. Mas, como alerta Eduardo Fagnani, coordenadora da Plataforma Política Social, esta será, provavelmente, uma disputa a ser decidida nos pênalties. Ainda que o ex-presidente leve a disputa até as portas do segundo turno, não se deve menosprezar a força do bloco conservador. Os riscos de uma impugnação final são altos.

Por isso, a última sondagem sugere a conveniência de uma articulação Lula-Ciro. Ela não deve tomar a forma (ao menos agora) de uma chapa conjunta – mas pode surgir como um discurso articulado para as eleições. A base comum está clara na própria fala dos dois postulantes: questionar o golpe e a agenda de retrocesos – propondo, em especial sua anulação por meio de Referendos Revogatórios.

IV. É quase pleonástico afirmar, mas a cobertura do velho jornalismo sobre a pesquisa é, mais uma vez, vergonhosa. A Folha, que realizou a pesquisa, esmera-se em esconder ser resultado principal. Prefere dar destaque ao cenário sem Lula. Mais grotesco: na Globo, o Bom dia, Brasil simplesmente não noticiou o fato mais importante do dia. Preferiu dedicar longos minutos a acidentes de trânsito corriqueiros.

O malabarismo chega a ser comovente, mas desperta a questão: é possível tapar o sol com a penenira?

*Antonio Martins é Editor do Outras Palavras

PARA ONDE CAMINHAS GUINÉ-BISSAU?


Eugénio Costa Almeida* | opinião | Pululu

Amanhã, 1 de Fevereiro de 2018, poderá ser o “dia D” para a política Bissau-guineense.

Ou a nomeação de um primeiro-ministro é formalmente aceite por todos, partido políticos, organizações internacionais e CEDEAO ou o pais entra numa perigosa espiral que poderá levar a uma de duas situações:
1. 
ser totalmente ostracizado pela comunidade internacional e seus políticos (por extensão, o País) serem sancionados pela CEDEAO, CPLP, União Europeia e Nações Unidas, na linha do que a organizações regional já o solicitou para o apoio a uma "aplicação eficaz das sanções";

2.   ou o País entra, definitivamente, no clube dos “Estados Falhados” com todas as consequências que daí podem advir; por exemplo, ser “tutelado” – e essa vontade já vem de antanho – pelo Senegal!

Apesar do Presidente José Maria Vaz “JOMAV” ter nomeado um novo primeiro-ministro, o embaixador e antigo MNE, Artur Silva, a realidade é que a política interna está muito adoentada ao ponto de, ontem, a polícia ter invadido a sede do PAIGC e expulso os congressistas com meios que não se compreendem nem numa ditadura, quanto mais numa suposta democracia conforme hoje foi transmitido na RTP-Africa e fotos colocadas por João Carlos, no Facebook.

Ora esta anómala situação – até porque não se compreende porque o Congresso foi impedido, pelo Tribunal, de se realizar, se  o 15 proscritos” já terão sido reintegrados no partido criado por Amílcar Cabral, conforme ouvi, ontem, numa reportagem televisiva –,já mereceu críticas de ONG questão  envolvidas no processo de consolidação de paz na Guiné-Bissau, "P5", pedem respeito pela lei e direito à liberdade de reunião e de participação política.

Acresce que a #CEDEAO já fez saber que mantinha a intenção de levar por diante as sanções a dirigentes políticos Bissau-guineenses se não fosse indigitado um primeiro-ministro iaté ontem e de consenso, conforme o estabelecido nos Acordos de Conacri. Ora, do que já li e ouvi, o novo primeiro-ministro não parece gozar desse consenso, pelo que é expectável que amanhã a CEDEAO comece a impor sansões ao já debilitado país da CPLP.

Até porque o PAIGC, continua a exigir que o primeiro-ministro seja o seu dirigente Augusto Olivais, proposto no âmbito do Acordo de Conacri, e que parece ter tido o acordo da CEDEAO,

Ora sabendo que a CEDEAO, como foi referido logo no início, terá solicitado à União Africana, à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – e aqui, Angola e João Lourenço poderão ter um pepel importante dada a aproximação que, ancestralmente, têm com o PAIGC e, agora, parece, com JOMAV –, à União Europeia e às Nações Unidas para apoiarem uma "aplicação eficaz das sanções", aguardemos por o dia de amanhã ou por algum comunicado que a CEDEAO hoje possa emitir a confirmar a aceitação ou não de Artur Silva!

Até lá, “Quo Vadis Guiné-Bissau”?!

*Investigador do CEI-IUL e Pós-Doutorando da FCS-UAN

*Eugénio Costa Almeida – Pululu - Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais - nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

Novo PM guineense promete um Governo "com todos" os signatários do Acordo de Conacri


Novo primeiro-ministro guineense, Artur Silva, de 61 anos, investido no cargo esta quarta-feira (31.01), prometeu "para breve" o seu Governo que será integrado "por todos" os signatários do Acordo de Conacri.

O Acordo de Conacri é um documento proposto pela Comunidade Económica de Estados da Africa Ocidental (CEDEAO) e rubricado, em outubro de 2016, por líderes guineenses, visando acabar com a crise política. Dois anos depois da assinatura do acordo, a crise ainda persiste.

A CEDEAO ameaçava aplicar sanções se até esta quarta-feira não fosse nomeado um Governo com base no referido acordo, assinado pelos cinco partidos com assento parlamentar, o líder do Parlamento e o grupo dos 15 deputados expulsos do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).

Vencedor das últimas eleições legislativas, o PAIGC e outras duas formações políticas com assento parlamentar, a União para Mudança e o Partido da Convergência Democrática, todos subscritores do Acordo de Conacri, já anunciaram que não vão aceitar um primeiro-ministro que não seja nomeado na base do referido acordo.

Devido à falta de entendimento entre os signatários do Acordo do Conacri à volta da figura de Augusto Olivais que era apontada como a consensual no âmbito daquele documento, o Presidente guineense decidiu escolher Artur Silva como primeiro-ministro.

Eleições legislativas entre abril e maio

Artur Silva afirmou, em poucas palavras após a sua investidura disse que o seu mandato irá focar-se na realização das eleições legislativas entre abril e maio, tal como prevê a lei guineense.

"A minha principal tarefa é a realização das eleições legislativas. Brevemente teremos um governo formado por todos os signatários do acordo de Conacri".

Militante e dirigente do PAIGC, Augusto Artur António da Silva, nascido em Bissau, é engenheiro de pescas formado entre o Brasil e Inglaterra, que já desempenhou vários cargos governamentais, nomeadamente ministro das Pescas, dos Negócios Estrangeiros, da Educação, Juventude e Desporto.Também foi ministro da Defesa guineense.

Artur Silva desempenhou igualmente as funções de conselheiro político e diplomático de Domingos Simões Pereira, na altura em que aquele chefiou o Governo, saído das eleições de 2014, mas entretanto demitido por José Mário Vaz.

Presidente da República diz ser o "primeiro dos inconformados"

O Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, afirmou que é "o primeiro dos inconformados" com o estado de coisas negativas que acontecem no país, mas também é o ultimo a desistir do combate para as mudar. 

No seu discurso de posse do novo primeiro-ministro Artur Silva, José Mário Vaz disse ser chegada a " hora da verdade e do trabalho" para construir uma Guiné-Bissau melhor. "Como já tive oportunidade de referir em outras ocasiões: Sou o primeiro dos inconformados com o atual estado das coisas negativas e serei o ultimo a desistir deste combate", destacou o líder guineense.

Na cerimónia de posse, o Presidente guineense apresentou Artur Silva como primeiro-ministro da sua confiança e pediu que os cidadãos do país também confiem no novo chefe do governo.

O Presidente disse que Artur Silva terá como tarefa principal organizar eleições legislativas ainda este ano e que sejam livres e transparentes.

José Mário Vaz considerou não ser fácil governar a Guiné-Bissau, mas também afirmou que não é uma tarefa impossível desde que se tenham "pessoas certas em lugares certos e com políticas certas".

No discurso, o líder guineense não se referiu à Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO) que ameaça aplicar sanções aos dirigentes do país lusófono se estes não alcançarem entendimento quanto à figura do primeiro-ministro até hoje.

Uma delegação de alto nível daquela organização está em Bissau desde a manhã desta quarta-feira.

"Hoje mais do que nunca o nosso destino está nas nossas mãos", frisou José Mário Vaz.

Agência Lusa, Braima Darame (Bissau) | Detsche Welle

LUANDA, 442 ANOS…



Martinho Júnior | Luanda

1- A cidade capital de Angola perfez a 25 de Janeiro de 2017, 442 anos, o que significa que na África Austral é das cidades mais antigas do continente africano.

Historicamente Luanda é um marco exponencial da concepção dum país pensado a partir das iniciativas de quem chegou por mar, inclusive enquanto uma das plataformas indispensáveis como recurso de penetração no interior por parte do colonialismo português, algo que não se conseguiu rectificar depois da independência nacional, vai para 43 anos!...

Outras cidades do litoral angolano foram criadas no mesmo diapasão, como Benguela, Porto Amboim e Moçâmedes (que saudosismo colonial é revelado pelo regresso a esse nome), sendo a única excepção a cidade e porto do Lobito, o único fruto criado já em época de revolução industrial, correspondendo aos interesses da aristocracia financeira mundial e seu “lobby” dos minerais (casas Rockefeller e Rothschield, por via das iniciativas de Cecil John Rhodes e dos seus “homens-de-mão”, neste caso de Robert Williams, em prol do império britânico).

Se as cidades da colonização portuguesa eram feitorias litorais com fortim (Luanda assistiu à criação de pelo menos três), plataformas de encontros das caravanas que partiam e chegavam penosamente do interior, Lobito foi a única que foi criada e concebida já no início do século XX, em função dum caminho-de-ferro internacional de penetração conectando o seu porto e de modo a que os minérios do Katanga (RDC) e do “copperbelt” da Zâmbia fossem explorados e exportados de África, para os grandes centros industriais dos Estados Unidos e Europa.

A cidade e o porto do Lobito foi assim a única implantação no litoral angolano que não assistiu ao comércio e embarque de escravos, como aconteceu com as outras…

“Paga castigo” por causa disso, não podendo ser capital de província alguma e eu por tabela até parece “pagar castigo”, por incognitamente ter nascido num “bungalow” (as primeiras instalações, já desaparecidas, do hospital do CFB)!...

2- Os portugueses como bons geógrafos, escolheram bem a implantação de Luanda: num meridiano de 300 milhas náuticas existiam (e existem ainda hoje) disponibilidades de aguada ímpares a sul do grande Congo: o M’Bridge, o Loge, o Dange, o Bengo, o Cuanza, o Longa e o Queve, entre outros cursos, rompem com os fenómenos de desertificação que por influência da corrente fria de Benguela se estendem desde o sul.

Também por engenharia que entrelaça o depósito de aluviões do Cuanza e a força da corrente fria de Benguela que se desloca ao longo da costa desde o sul do Atlântico, as areias acumuladas possibilitaram a formação de baías que são abrigos naturais, como a do Mussulo e a de Luanda, o que favorecia também os enredos de segurança indispensáveis à implantação das feitorias e dos navios à vela de então.

Por fim, no paralelo de Luanda a planície do litoral angolano alarga-se numa profundidade de mais de 200 km, até ao Dondo, o que possibilitava a formação dum domínio suficiente para ganhar forças e galgar na profundidade as serranias na direcção do interior leste, cavalgando os planaltos imensos que se inclinam até à fronteira com os países que são hoje a RDC e a Zâmbia.

Mesmo assim a resistência nos Dembos aconteceu até 1917!

3- Luanda e Benguela foram as feitorias que haveriam de servir de base à implantação de infraestruturas, estruturas e polos industriais, que até à década de 60 do século passado eram raquíticas, por que por si o colonialismo português, não abrangido pela revolução industrial e de características meio feudais (reflectindo uma burguesia agrária que esteve na base do suporte ao fascismo), só com a aquiescência para com o seu aliado principal, a coroa britânica, conseguiu romper com o palúdico marasmo tropical.

Foi em resultado do início da luta de libertação nacional que o colonialismo português tentou reagir e estabeleceu projectos geoestratégicos que aproveitavam a visão de quem chega por mar: a criação dum triângulo do litoral com maior densidade populacional e malha mais apertada de ocupação e serviços administrativos, onde implantou, longe das fronteiras, o grosso das infraestruturas, estruturas e seus polos industriais de desenvolvimento (década de 70 do século XX), com Luanda a, nesse papel, ser uma das principais molas impulsionadoras para as vias e meios a potenciar até à região central das grandes nascentes.

Isso foi de tal modo determinante que todos os colonatos foram implantados dentro desse triângulo e a geoestratégia do Exercício ALCORA em território angolano tem tudo a ver com essa artificiosa razão causal da internacional fascista!

Assim, à data da independência Luanda teria pouco mais de 600.000 habitantes, cerca de 1/8 da população total de Angola de então, um país meio adormecido, meio despovoado e esvaído em seus fantasmas de opróbrio, escravatura e colonialismo!...

4- As disputas pela independência, entre o movimento de libertação e os etno-nacionalismos semeados pelas correntes mais retrógradas e afoitas ao neocolonialismo, seguidas pela luta contra o “apartheid” e sua panóplia de aliados internos e externos, não trazendo no após independência alterações às projecções coloniais em relação à implantação de infraestruturas, estruturas e polos industriais, começaram por inércia a ser uma fonte de atracção para com as comunidades rurais do interior, parte delas afectadas directa ou indirectamente pelas convulsões que se foram sucedendo.

Esse fenómeno contrariou a visão oportunista e subversiva de Savimbi, expressa pelo professor da Sorbonne, Atsutsé Kokouvi Agbobli em “Jonas Savimbi – combates por África e a democracia”, também exposta no então lugar digital na Internet da “Association Franco-Africaine pour la Renaissance et la Democratie” (“AFARD”), com sede no nº 66 da Avenida Champs – Elysées, 75.008, Paris, (http://www.afard-unita.asso.fr/), quando havia formulado a luta “do interior” contra “o litoral”, dos “autóctones” contra os“crioulos”, numa altura em que nem a sua mobilização poderia fazer mais parar a atracção das comunidades à relativa segurança do litoral angolano, bem longe das fronteiras onde ocorria a “Iª Guerra Mundial Africana” que teve quota-parte de sua autoria!

Esse assunto foi mesmo apresentado a 5 de Maio de 1998, num colóquio realizado na Sorbonne subordinado ao tema “GUERRE OU PAIX EN ANGOLA?”, promovido pelos sectores favoráveis à UNITA, aproveitando praticamente as comemorações dos 30 anos do Maio de 1968, dando seguimento propagandístico às ideias expressas por Savimbi em entrevista realizada pelo próprio Atsutsé Kokouvi Agbobli, traduzida no livro “JONAS SAVIMBI – COMBATES PELA ÁFRICA E PELA DEMOCRACIA”, facto que a partir do contentor de apoio ao Estado-Maior das FAA reportei a 18 de Julho de 1998 em “UNITA – Uma nova estratégia de desestabilização do País – II”… 

A entrada no período do choque neoliberal em 1992 criou em Savimbi essa contradição que o seu fundamentalismo doutrinário e ideológico, embriagado pelos interesses e conveniências externas e pelo calor das refregas da “somalização”, não detectou a tempo, num mal avisado processo telúrico que concorreu para o seu esgotamento sócio-político e para o seu próprio final em 2002.

Nesses dez anos os refugiados internos afluíam massivamente ao litoral numa cadência cada vez mais significativa e foi assim que em 2002 se iniciou o período dos impactos do âmbito da terapia neoliberal que se sucederam ao choque, cruamente expostos em Luanda!

5- Desde o início do século XXI, poucas iniciativas têm rompido com essa tendência de fluxo interno de migrações humanas a serem sorvidas pelo litoral e particularmente por Luanda e a cosmopolita região de Benguela-Catumbela-Lobito, pelo que em termos de geoestratégia de implantação de infraestruturas, estruturas e polos industriais, não houve ruptura em relação ao colonialismo de última geração, aquele que injectava os processos de assimilação finais.

Nesse sentido a barbárie de Savimbi foi providencial!

As culturas tradicionais das comunidades rurais entraram em colapso e os migrantes forçados instalaram-se nos subúrbios em subculturas recentes, precárias e mal interiorizadas, autênticos mal parados cinturões de musseques em torno da área urbanizada, onde imperava a miséria, a subnutrição, a falta de infraestruturas sanitárias, a doença, a anarquia das construções… onde se instalou a marginalidade e a criminalidade de rua!

Houve um enorme esforço no sentido de alterar em sentido inverso essa imensa derrapagem humana, num processo que continua.

A cidade de Luanda possui agora, de acordo com estimatiuvas correntes após o censo, 8,3 milhões de habitantes, cerca de 12 vezes a sua população em 1975, 1/3 da população de Angola contemporânea e expandiu-se entre o Bengo e o Cuanza, bem como ao longo da planície do litoral em direcção ao Dondo, dum modo não programado e com todos os inconvenientes duma acelerada desertificação por acção humana, visível por exemplo para quem consulta o “Google Earth”.

Foi assim que se confiou no deus mercado e no seu livre arbítrio em Angola!

Foi também assim que o porto de Luanda assistiu ao fim do seu nó ferroviário, em benefício de privatização de interesses, que alterou profundamente os conceitos de suas infraestruturas e estruturas e deu azo a que empresas privadas de camionagem tomassem o lugar dos comboios!

As “novas elites” tenderam a ocupar a faixa do litoral a seu bel-prazer e as populações “de baixa renda” tiveram de se contentar em ser encaminhadas para áreas como o Zango, entre Viana e a povoação ribeirinha da margem direita do Cuanza, Calumbo, novas fronteiras com intensas marcas psicológicas em função dessas “novas projecções”!

Luanda, no seu 442º aniversário e em pleno período de impactos de terapia neoliberal, cresceu, mas não se desenvolveu de forma sustentável e equilibrada, muito menos harmónica, pior ainda em relação ao ambiente, enquanto Angola continua “por arrasto” numa inerte geoestratégia colonial em termos de implantação de infraestruturas, estruturas e polos industriais, apesar da construção das barragens no médio Cuanza, assim como das políticas tão urgentes de diversificação económica, abrirem um postigo para finalmente se poder inaugurar a nova geoestratégia para um desenvolvimento sustentável que tenho vindo a propor, que poderá vir a reflectir os enormes potenciais da própria independência, soberania e identidade nacional, conformes ao programa maior do MPLA!

Enfrentar as assimetrias só poderá plenamente acontecer quando se iniciar um quadro assumido nessa geoestratégia carente de patriotismo e de socialismo (palavra abolida dos dicionários angolanos)!

6- Luanda reflecte hoje todos esses momentos históricos de intensidade variável, que passaram dos tempos das trevas, aos tempos palúdicos e dos tempos palúdicos coloniais, aos tempos heroicos da independência e por fim a um frenético crescimento mercenário, misto de ilusões, deslumbramentos e enriquecimentos fáceis e fúteis, mas sobretudo o dum crescimento populacional sem precedentes entre 1975 e 2018, em 43 anos!

Cresceram os arranha-céus de cimento armado, vidro e detentores de padrões elevadíssimos de consumo energético, nas mesmas ruas estreitas e em declive até à quota do mar do passado, contrastando com as velhas construções térreas do tempo da criação das fortalezes, em vias de desaparecer, dos robustos edifícios da época do café (conforme os que possuem fachadas com grandes arcadas, na Marginal, entre eles o edifício do Banco Nacional de Angola), bem como das construções mais elevadas dos tempos dos primeiros diamantes fora do controlo da empresa majestática que foi a Diamang (por exemplo o Hotel Presidente)…

Luanda dos impactos neoliberais e dos deslumbramentos daqueles “novos-ricos” que copiaram nos Dubais e outros exteriores a sua apressada visão das grandes cidades, tornou-se num universo concentracionário que absorve as energias nacionais e se esgota estonteante no comércio “da revirada” mercenária: para quê fornecer a todo o país, que só dá prejuízo e chatice por causa dos custos e sacrifícios em transportes, quando cerca de 30% da população de Angola está ali concentrada e à mercê dos grandes apetites?...

… E o crescimento das infraestruturas e estruturas de Luanda tornou-se tão precipitado, desordenado, selvagem e anárquico, que “se meteu o Rossio na rua da betesga” (assimilação a quanto obrigas) e até os parques florestais recomendáveis para as grandes urbes do globo, foram “irremediavelmente” esquecidos (ironia deste destino, eles em função dos desertos são incomportáveis, tal e qual como nos Dubais)!

As palmeiras da nova Marginal 4 de Fevereiro foram importadas da Flórida por “iluminados” desta globalização de espelhos capazes de tudo esbanjar e a flora local foi dispensada e remetida ao cada vez mais reduzido espaço em torno do morro da fortaleza São Miguel, agora Museu Militar: num claro aviso para que não houvesse dúvidas, nem hipótese de escapar aos novos tempos, até uma fortaleza de consumo está implantada agora nesse mesmo morro, uma “nova fortaleza” ainda por inaugurar, tapando das vistas de quem acede ao local a partir da própria marginal, a fortaleza original!...

7- Os angolanos continuam “amarrados” às projecções geoestratégicas assimiladas do passado, das visões de quem chega pelo mar, apesar das novas barragens que o Presidente João Lourenço levou como sinal de independência e soberania para Davos, apesar de ser tão importante uma diversificação económica que se alimente da agricultura, da pecuária e dos imensos espaços vitais do interior polvilhados da água dos fartos rios, alguns dos quais aproveitando a partir da região central das grandes nascentes o declive suave para o interior, na direcção das grandes bacias do Congo e do Zambeze!

Os angolanos continuam “amarrados” a Luanda, agora capital referencial dos deslumbramentos e lantejoulas neoliberais típicos da terapia em plena globalização “inaugurada” com a “era Bush” em 2002, há apenas 16 anos dos actuais 442 anos que perfazem sua idade!

Os sonhos de independência, soberania e fortalecimento da identidade nacional, os sonhos dum amplo renascimento para o povo angolano e para os povos de África, são ainda para muito poucos que ousam enveredar pela crítica ao passado, incluindo o passado recente, numa lógica com sentido de vida que seja uma antítese à barbárie da “somalização”, mas há que romper em definitivo com todos os pesadelos que se esbatem desde o passado das grandes trevas até hoje, pelo que conhecer os termos da evolução de Luanda, é cultural e inteligentemente indispensável para, começando a romper com eles, se poder semear civilizadamente em direcção ao futuro!

Martinho Júnior - Luanda, 25 de Janeiro de 2016

Imagens do arquivo de MJ:
Luanda a 1 de Maio de 2006, vista da fortaleza;
Luanda, a 11 de Julho de 2017, vista da fortaleza e em direcção ao mesmo enquadramento;
Luanda, Grande Hotel Luanda, hoje Casa da Cultura do Brasil (2017);
Luanda, BNA noturno visto do Museu da Moeda (5 de Janeiro de 2017);
Luanda, Monumento ao Soldado Desconhecido, o último monumento que foi inaugurado na capital.

Radar Magrebe Lusófono #12: Angola, os 100 dias que passaram e os 100 dias que virão


A percepção relativamente a Angola é a de que o novo Presidente vai primeiro arrumar a casa, para depois se concentrar na imagem e no envolvimento do pais a nivel externo. (Artigo do Politólogo Raúl M. Braga Pires)

A percepção nas diversas chancelarias Mundo afora, relativamente a Angola, é a de que o novo Presidente está primeiro a arrumar a casa, para depois se concentrar no Política Externa. Aliás, a recente e inédita conferência de imprensa dada por este, poderá muito bem marcar a fronteira entre as prioridades do momento e as futuras.
Quanto à Política Externa, Angola, tradicionalmente não costuma fazer muito alarido, nem ter mudanças radicais, segundo o Africanista e Investigador luso-angolano Eugénio Costa Almeida (CEI-ISCTE).

A mudança de Presidente é o momento ideal para proceder a mudanças, mas para este especialista, uma das prioridades externas angolanas continuará a ser a República Democrática do Congo (RDC) e o interesse em manter a estabilidade deste aliado que tem agora em Joseph Kabila um imbróglio constitucional, já que o 2º Mandato Presidencial expirou em Dezembro de 2016 e Kabila não pode concorrer a um 3º Mandato.

Angola, enquadrada nesta que parece ser uma nova Era para África, onde as eleições e a alternância democrática se impõem à Cultura do Soba, a bem da estabilidade dos Grandes Lagos, pretende ser um Fiel da Balança que prove saber agir e mediar este processo dentro da constitucionalidade.

Angola tem ambições regionais com alcance continental e nesse sentido, sempre projectei uma mudança de fundo que envolvesse uma aproximação a Marrocos, como se constatou com o apoio dado à reintegração do Reino na União Africana (UA). Essa aproximação teria como culminar no longo prazo, um natural “desreconhecimento” da RASD/POLISARIO por parte de Angola, descartando o Eixo Argel/Abuja/Pretória e integrando um novo Rabat/Dakar/Luanda.

Eugénio Costa Almeida refreia-me os ânimos e diz que será muito difícil de algo parecido acontecer, já que Angola é a “porta de salvaguarda e de acesso pelas traseiras” da SADC, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (Angola, África do Sul, Botswana, República Democrática do Congo, Lesoto, Madagascar, Malawi, Maurícia, Moçambique, Namíbia, Seychelles, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwe), já que a estes países não interessa uma África do Sul hegemónica.

“Essa força de Angola – se assim se pode dizer – como a tal porta de salvaguarda, começou a ter mais importância quando estes países da SADC verificaram que as intervenções sul-africanas nas questões africanas, principalmente com Thabo Mbeki, na questão dos Grandes Lagos, eram, ou visavam, mais a salvaguarda e a defesa dos seus interesses de imagem política para o exterior, que resolver os problemas africanos. E foi aí que Angola assumiu, ainda mais a sua força potencial – ou se tornou na efectiva potência – da CEEAC”, conclui Costa Almeida. Esta Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC), um segundo enquadramento institucional para os angolanos, os quais definem bem as suas prioridades em Política Externa continental e os constrange, de certa forma. SADC e CEEAC serão os palcos privilegiados e uma deriva deste foco apenas prejudicaria uma posição firmada de Luanda à República Centro Africana.

Na verdade e em rigor, há um maior interesse de Marrocos em Angola, que o contrário. A banca e as empresas marroquinas estão interessadas na potencialidade deste mercado, no petróleo e, sobretudo em ganharem posições de força, créditos, para poderem influenciar, a montante, decisões de Política Externa angolana, sobretudo nos dossiês RASD/POLISARIO e Argélia e que se deverão depois reflectir no seio da União Africana.

Tunísia regressa aos protestos, 7 anos depois

7 anos e 9 Governos depois, a Tunísia voltou à rua, o que deverá ser considerado normal, para quem sempre viu a "Primavera Árabe" como um processo.

Prova disso, é este protesto contra a Lei de Finanças de 2018 unir os manifestantes, a população e, já não os dividir entre laicos e islamistas. Ou seja, essa fase já passou e as manifestações têm um aparente voluntarismo por parte da população, que a partir das 20h dos últimos dias desta semana, se têm concentrado nas principais praças do país, onde protestam contra o custo de vida dizendo, 7 anos depois continuamos com fome! A inflação subiu até aos 6,4% em Dezembro, batendo todos os recordes, houve alterações nas tarifas aduaneiras o que encareceu os produtos importados e também foi criado um imposto Municipal para habitações, que poderemos comparar ao famoso IMI em Portugal.

Há também que pagar empréstimos e juros no estrangeiro.

Estas manifestações, que à semelhança do 17 de Dezembro de 2010, início da Primavera Árabe, iniciaram-se no Sul do país e têm-se alastrado território acima, têm tido picos de violência entre manifestantes e Polícia, com centenas de detidos, múltiplos feridos entre manifestantes e Polícia, pelo menos um morto e pilhagens atrás de pilhagens, o que coloca a dúvida sobre quem estará nos bastidores a comandar os acontecimentos e, desta vez, não deverá haver mão islamista a puxar as cordas.

Digo isto porque o Ennahda, o Partido Islamista local e seu líder, Rachid Ghannouchi teriam muito mais a perder que a ganhar, já que foram até aqui a razão para a estabilização da Tunísia, no pós-eleições, já que entre 2011 a 2014 perderam a hegemonia, aceitaram-na (caso inédito), fazendo aliás parte da “Geringonça” que governa o país desde 2014. Promover a pilhagem nocturna, seria um regresso aos fantasmas de 2011 e um perder da credibilidade de alguém, Ghannouchi e seu Partido, que ambicionam uma Tunísia de modelo Turco, rejeitando ao mesmo tempo o modelo extremista afegão e saudita.

É mais possível aliás, tratarem-se de filhos e netos de militares e/ou polícias do antigo regime a aproveitarem esta onda contestatária para a tornarem na clássica espiral de violência do quanto pior melhor, já que nada têm a perder, do que o déjà vue islamista que torna resultados eleitorais e manifestações democráticas em arma de arremesso, subvertendo assim o processo e tomando a dianteira deste.


*Politólogo/Arabista/Colaborador VOA/Radar Magrebe

VOA

PORTUGAL | Com um brilhozinho na venda

Pedro Ivo Carvalho | Jornal de Notícias | opinião

De todas as vezes que um "tubarão" é apanhado nas malhas de uma investigação criminal, somos assaltados pela dúvida: estará a Justiça refém da exposição dos casos mais mediáticos para dar provas de vida e de imparcialidade? E essa dúvida leva-nos a outra: será que ela se alimenta dessa circunstância para justificar algumas das suas práticas? Deitar a Justiça num divã para lhe medirmos o pulso e a orientação é um exercício quase tão velho como a opção de tapar com uma venda os olhos da deusa que a simboliza. Mas nunca como agora foi tão premente discernir ação de reação. Porque uma Justiça que brilha não é o mesmo que uma Justiça brilhante.

A tentação, porém, é grande. E ontem, a propósito da Operação Lex, pudemos ver como, mais uma vez, o "sistema" sucumbiu ao gostinho de transformar um caso suculento num seletivo espetáculo televisionado, mandando novamente às malvas esse conceito tão debatido e vilipendiado que é o segredo de Justiça. Ora, parecendo isto uma maleita marginal que afeta um corpo em constante regeneração, pode vir a degenerar, a prazo, numa perversão que mina não só a seriedade daqueles que todos os dias aplicam as leis e conduzem as investigações criminais, como ferir de morte a confiança que os cidadãos depositam nesses mesmos protagonistas. As luzes do palco conseguem ser ofuscantes se estiverem sempre apontadas na direção dos atores.

Certamente que a publicitação das boas práticas judiciais (garantida pelo alcance mediático dos suspeitos sob investigação) tem o efeito de atenuar os efeitos nefastos das más práticas judiciais. Em particular aquelas que, no recato dos tribunais e sem câmaras de televisão por perto, permitem, como foi revelado há dias, que uma anónima mulher vítima de violência doméstica morra às mãos do marido agressor por inépcia de um Ministério Público que não acionou nenhum dos mecanismos previstos na lei para protegê-la. Apenas 37 dias depois de essa mesma mulher apresentar a primeira queixa.

Ter uma Justiça atuante, que não se intimida ante os mais poderosos ou influentes, como temos testemunhado no mandato da atual procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, só nos tranquiliza verdadeiramente se isso não significar que, fora dos holofotes, ficamos entregues aos vícios do costume. Os troféus fazem bem ao ego da Justiça, mas não podem ser a base da sua dieta.

*Subdiretor do JN

Portugal | PIM, PAM, PUM… MAS ESCAPAM MUITOS


Bailarico saloio na justiça e arredores, pois é disso que o Expresso Curto de hoje trata. Chegou pelas 9 da manhã cá pelo burgo mas só agora metemos a mão na massa e os olhos no que João Vieira Pereira, do Expresso, escreveu. Andamos retardatários, sabemos. Esperamos melhorar na pontualidade. E agora vamos então mete as mãos na chafurdice que é o setor da justiça tão desacreditado. Faça contas e verá quão justo é o título otimista que vem da lavra do ator principal que elaborou o tal Expresso Curto. Pim, pam, pum…

A ramona saiu e arrebanhou uma larga quantidade de senhores do topo intermédio. Até juízes e advogados, dirigentes de futebol e mais este e aqueloutro. Ena pá! É a operação da Polícia Judiciária considerada mobilizadora de imensos elementos, mais de 100. Foi muita tropa para tal operação policial. Aos contribuintes custa um balúrdio. Mas tem de ser.

Acerca dos visados na operação talvez falemos amanhã com as atualizações da ordem. É que aquilo ainda está muito pela rama. Ao que dizem há mais uns quantos a ser constituídos arguidos. Vai ser cá um pim, pam, pum! Bem, mas escapam muitos ainda. Pode não ser desta operação mas sim dos que fazem falcatruas, enriquecem ilicitamente, fazem disto um cabaré da coxa… que até contagiam a justiça. Pois, tinha de ser.

Adeus, até ao nosso regresso. Amanhã, loguinho de manhã. Ou se não vá ao Expresso online e veja o Curto. Bom resto de dia e noite. MM | PG

Pim Pam Pum… não escapa um

João Vieira Pereira*| Expresso Curto

Bom dia. Bem vindo a mais um Expresso Curto, este com uma novidade guardada mais lá para o final, pela mão de Henrique Raposo. Mas vamos às notícias.

Pode ter sido coincidência que o Governo, através da ministra da Justiça, tenha colocado na agenda, em janeiro, a substituição da Procuradora-Geral da República (PGR), o que só deverá acontecer em outubro deste ano. Ou descuido que António Costa tenha saído em defesa de Francisca Van Dunem na não recondução de Joana Marques Vidal. Pode ter sido por acaso que o tema tenha levado a um choque entre Belém e S. Bento, com Marcelo a defender publicamente o trabalho da PGR. Pode ter sido azar que tudo isto tenha sido feito antes do encontro entre António Costa e o presidente de Angola, país que critica fortemente a Justiça portuguesa por causa do caso Manuel Vicente.

E, agora sem ironia, de certeza que foi mesmo má sorte tudo isto ter acontecido nas vésperas de Mário Centeno ter sido envolvido numa investigação por causa de um pedido, muito parvo, de uns bilhetes para ir à bola, e um outro pedido de isenção de IMI para uns negócios ‘do filho’ do presidente do Benfica. Caso que já levou o Partido Popular Europeu a pedir uma discussão das ‘alegações contra o presidente do Eurogrupo’, para decidir se leva o assunto ao plenário da próxima semana em Estrasburgo. PS, PSD e PCP estão contra.

Se dúvida houvesse que a Procuradoria-Geral da República, pela mão da atual detentora do cargo, tem atuado independentemente de qualquer poder, essa ficaria sanada apenas pelo que aconteceu nos últimos dias. Não só a investigação a Mário Centeno, mas também a capacidade de enfrentar todos os outros poderes, os económicos, os judiciais e até o maior de todos, o do futebol. Pim Pam Pum… não escapa um!

Ontem o Benfica voltou a cair nas malhas da Justiça. E não caiu sozinho. Rui Rangel, juiz desembargador, que foi candidato à presidência do Benfica, é suspeito da prática dos crimes de tráfico de influências, branqueamento e fraude fiscal qualificada. Luís Filipe Vieira é arguido no caso, indiciado por tráfico de influências. No mesmo processo foi constituída também arguida a juíza desembargadora Fátima Galante, ainda casada com Rui Rangel.

A operação originou 33 buscas e foram detidas cinco pessoas: o advogado Santos Martins, o seu filho, um oficial de justiça, um outro advogado e a mãe de uma filha de Rangel, Rita Figueira.

Pode ler toda a informação sobre o caso aqui.

A notícia marca os jornais do dia. O Público escreve que ‘Rangel é suspeito de ter vendido decisões judiciais’. O JN diz que ‘Vieira foi apanhado na rede de juiz’. O Correio da Manhã também faz manchete com o caso: “Vieira paga cunha com tachos no Benfica” acusa o jornal, que adianta que escutas revelam que o presidente do Benfica pediu a intervenção de Rui Rangel num processo fiscal do seu filho. Só o DN não faz manchete com o caso.

Entretanto o Ministério Público (MP) também acusou dois secretários de Estado, do último Governo de José Sócrates, do crime de peculato por terem utilizado cartões de crédito atribuídos para fins públicos em benefício próprio. Em causa está o comportamento de José Magalhães e José Conde Rodrigues.

Agora Trump.

“Naquela noite, pouco depois das oito, quando o impensável – que Trump poderia mesmo ganhar – estava quase confirmado, Don Jr. disse a um amigo que o seu pai, ou DJT, como lhe chama, parecia ter visto um fantasma. Melania, a quem Trump garantiu não ganhar, estava lavada em lágrimas – e não eram de alegria.

Houve, como notou um divertido Steve Bannon, num espaço de pouco mais de uma hora, uma transformação: de um Trump confuso para um Trump incrédulo e por fim para um Trump horrorizado. Mas ainda estaria para vir a transformação final: de repente, Donald Trump transformou-se no homem que acreditava merecer ser, e que era mais do que capaz de ser, o presidente dos Estados Unidos.”

Este excerto (numa tradução livre) de ‘Fire and Fury’, — um livro obrigatório — é um dos meus preferidos. Resume a presidência de Trump: algo que não era suposto acontecer e que se transformou em algo para o qual ele pensa que estava predestinado.

E foi este Trump, triunfante e espantosamente conciliador, que falou ao Congresso no seu primeiro discurso do Estado da União. Para trás ficaram as posições radicais e nacionalistas e os ataques políticos. Em vez disso, pediu que “as diferenças fossem colocadas de lado” na procura de “entendimentos” e “unidade”. Foi neste mesmo tom que também pediu o apoio dos democratas às políticas de imigração e uma união em torno da plano de infraestruturas.

De fora ficaram os temas polémicos, nomeadamente o dossier russo. A Joana Azevedo Viana dá-lhe todos os pormenores.

Há novo documento na posse do FBI sobre as alegadas ligações de Trump à Rússia e como este país terá influenciado as eleições de 2016. O The Guardian conta-lhe tudo.

E já agora, mesmo que não goste de golfe, não deixe de se divertir com a revelação de que Trump é um batoteiro nato. Naquele desporto e não só.

OUTRAS NOTÍCIAS

Foi a estocada final em mais um grupo têxtil português. Os credores da Ricon aprovaram por unanimidade a sua liquidação. No entanto, pode ainda haver esperança para algumas empresas do grupo.

Quase todas as ambulâncias das seis associações humanitárias de bombeiros de Lisboa, cerca de 100, estiveram paradas porque a Câmara Municipal de Lisboa não pagou os seguros das mesmas como tinha prometido. Câmara promete resolver problema hoje.

As crises nos jornais são cíclicas e os leitores nem sempre conhecem as estratégias de cada título para ter receitas próprias. Há precisamente 100 anos, imprimiam-se 300 mil jornais por dia em Lisboa, e um diário da capital montou um serviço de recompra para fidelizar leitores, quando duplicou o preço de capa para fazer face à escalada do preço do papel que a I Guerra Mundial originou. Uma viagem de Manuela Goucha Soares pelo mundo dos jornais.

Francisco Pinto Balsemão, fundador do Expresso e principal acionista da Impresa, vai publicar as suas memórias. O livro tem publicação prevista para este ano.

O Porto empatou em casa do Moreirense. Para a história fica a entrevista rápida ao guarda redes de Moreira de Cónegos que pensava que tinha perdido o jogo. Hilariante.

Na Catalunha não houve investidura do Governo. A sessão do Parlamento não se realizou e horas depois Puigdemont falou através das redes sociais: “não há outro candidato possível”. Tudo adiado em Barcelona.

Time inclui Puigdemont na lista dos cinco fugitivos geopolíticos mais procurados. Ao seu lado estão Fethullah Gulen, Julian Assange, Ramush Haradinaj e Mikheil Saakashvili.

Theresa May inicia amanhã uma visita de três dias à China e leva um recado no bolso, “joguem de acordo com as regras”.

A Volkswagen suspendeu um dos seus executivos de topo depois de ter sido revelada que a empresa fez testes com humanos e macacos para provar que não existia relação entre as emissões dos carros a diesel e doenças respiratórias.

A Amazon, Buffet e a JP Morgan vão juntar-se para tentar reduzir os custos médicos de centenas de milhares dos seus trabalhadores. Do acordo sairá uma nova empresa tecnológica focada em encontrar soluções médicas.

Sobre tendências de negócios não perca a história de como o pupilo ultrapassa o professor, ou como o CEO da gigante AT&T fez Carlos Slim sair do topo da lista dos mais ricos do mundo.

A Apple vai reduzir para metade a produção do novo iPhone X devido a uma procura menor do que a esperada.

E em Silicon Valley há uma nova corrida nos veículos autónomos. Desta vez, as entregas de encomendas sem condutor são a nova estrela.

Como os mercados são um pouco maníacos, agora está tudo a vender. Depois de terem sido as obrigações, os investidores resolveram começar a vender ações. O mais rápido possível e por todo o mundo.

A Blackstone anunciou que vai comprar a Thomson Reuters e o seu negócio de terminais de dados por 17,3 mil milhões de dólares.

Na Cidade do Cabo há água para três meses. A seca ameaça a população e o Governo já avisou que em abril poderá chegar o “dia zero”, aquele em que as torneiras só deixarão sair ar.

No Irão, duas mulheres deram o tiro de partida ao retirarem o véu em público, num protesto contra as regras severas de vestuário impostas pelos líderes religiosos. Muitas mais seguiram o exemplo.

Puck tinha desaparecido dos écrans quando a série Glee chegou ao fim. Agora foi Mark Salling, o ator que encarnava a personagem, a desaparecer. Mark, que enfrentava uma pena de prisão que podia chegar aos sete anos por posse de pornografia infantil, apareceu morto em Los Angeles.

Todos os dias 11 mulheres irlandesas viajam até Inglaterra, ou País de Gales, para fazerem um aborto. O número foi divulgado depois de ter sido marcado, para maio, um referendo na Irlanda para abolir a ‘eight amendment” e permitir a interrupção voluntária da gravidez até às 12 semanas.

O QUE DIZEM OS NÚMEROS

Negócios da China - 60% do investimento angariado pelo programa dos vistos gold teve origem na China.

Desemprego em queda - A taxa de desemprego recuou 0,3 pontos percentuais, para 7,8%. O número de desempregados em dezembro ascendia a 401,5 mil pessoas. Há um ano era de 521 mil desempregados.

Governar pelo exemplo - George Weah, recém-eleito presidente da Libéria, decidiu cortar em 25% o seu salário e benefícios devido à situação económica do país. “A nossa economia está falida. O nosso Governo está falido. A nossa moeda numa queda livre. A inflação a subir. O desemprego nunca foi tão alto e as nossas reservas estrangeiras nunca foram tão poucas”, sublinhou.

Queda vertiginosa - €10,2 milhões foram os lucros do BPI no ano passado. O que contrasta com os €313,2 milhões de 2016. A queda foi justificada pelo programa de saídas voluntárias (saíram quase 600 trabalhadores no ano passado), pela venda de 2% e desconsolidação do Banco Fomento de Angola e os impactos extraordinários da atividade em Angola no último trimestre de 2017.

Hip hip hooray- 2,5% foi o crescimento da zona euro em 2017. O Eurostat deu a boa nova, o PIB fechou o quarto trimestre com um crescimento homólogo de 2,7% e um anual de 2,5%, o mais elevado desde 2007.

O QUE ELE ANDA A LER

Confesso que se torna impossível escrever “o que eu ando a ler” sem deturpar um pouco a verdade. Às vezes esta mini-rubrica devia chamar-se o que eu gostaria de andar a ler. Por isso resolvi pedir ajuda. Sugestões sobre o que outros andam a ler.

A primeira ‘vítima’ foi Henrique Raposo. Aqui fica:

“Ando a ler “Poemas Escolhidos” de T. S. Eliot, numa edição nova da Relógio D´Água. Por vezes, Eliot parece o homem que sabe que deve ter fé em Deus por oposição ao homem que acredita de facto em Deus. Seja como for, continua a ser um dos autores fundamentais para quem procura ver a modernidade através de um olhar cristão. Eliot mostra que o cristianismo é ao mesmo tempo um projeto ético e estético; as duas dimensões não se separam.

No romance, vou a meio da saga de Elena Ferrante “A Amiga Genial”, também da Relógio D'Água. Até agora, é um retrato notável, cru e violento da pobreza. Não há aqui falsas piedades neorrealistas: a pobreza não salva ninguém, ninguém é puro por ser pobre. Ferrante mostra como a pobreza cria uma cultura de violência que se torna numa identidade, um ethos que impede a libertação ou ascensão de quem é dali, um vórtice que puxa para baixo e que abole quase sempre a própria liberdade: o livre arbítrio está ativo, mas o perímetro da liberdade de escolha não existe. São notáveis e comoventes as páginas que relatam o primeiro contacto de Lenù com a burguesia da cidade.”

Este Expresso Curto termina aqui. Tenha uma ótima quarta-feira.

*Diretor-adjunto do Expresso

BRASIL | Após condenação, Lula segue como candidato favorito


Datafolha revela que ex-presidente mantém larga vantagem em relação a rivais, com até 37% das intenções de voto. Sem o petista, Bolsonaro lidera em todos os cenários, e disputa por vaga no segundo turno se acirra.

A primeira pesquisa de intenções de voto feita pelo Instituto Datafolha após a condenação em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgada nesta terça-feira (30/01), aponta que o petista mantém uma ampla vantagem em relação aos demais candidatos.

Em cinco cenários diferentes que incluem o nome do ex-presidente, as intenções de voto favoráveis a Lula variam entre 34% e 37%, mantendo uma distância confortável em relação ao segundo colocado, o deputado Jair Bolsonaro, cujo percentual variou entre 15% e 18%.

A simulação em que a vantagem do petista é maior (37%) inclui os nomes de Bolsonaro (16%), do PSC; Geraldo Alckmin (7%), do PSDB; Ciro Gomes (7%), do PDT; Joaquim Barbosa (5%), sem partido; Alvaro Dias (4%), do Podemos; Fernando Collor de Mello (2%); do PTC; e Manuela D'Ávila (1%), do PCdoB.

O levantamento realizado com a ausência de Lula entre os presidenciáveis, que simulou quatro cenários diferentes, revela uma tendência de pulverização de seu eleitorado, inclusive com um reforço à candidatura de Bolsonaro.

Sem Lula no páreo, caso o ex-presidente seja barrado sob a Lei da Ficha Limpa, Bolsonaro lidera com entre 18% e 20% das intenções de voto. Nessas circunstâncias, os demais candidatos também ganham mais apoio.

No principal cenário sem Lula, Marina Silva, da Rede, aparece em segundo lugar, com entre 13% das intenções de voto, seguida de perto por Ciro Gomes (10%), Alckmin (8%) e Luciano Huck (8%), sem partido. Com Marina fora da corrida, Ciro aparece na segunda colocação em ambos os cenários possíveis, logo à frente do governador de São Paulo.

No segundo turno, Lula venceria em possíveis disputas com Alckmin, Marina ou Bolsonaro. Sem o petista, Alckmin aparece tecnicamente empatado tanto em uma disputa com Ciro Gomes quanto em uma disputa com Bolsonaro. Num segundo turno entre Marina e Bolsonaro, a candidata da Rede sairia vencedora.

A pesquisa Datafolha, publicada pela Folha de S. Paulo, foi realizada entre os dias 29 e 30 de janeiro. Foram entrevistadas 2.826 pessoas em 174 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos. Lula foi condenado em segunda instância no último dia 24 de janeiro.

Lula na disputa?

A elegibilidade do petista ainda é incerta. Na semana passada, os três juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmaram a condenação de Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, imposta pelo juiz Sérgio Moro, no processo que envolve a propriedade de um tríplex no Guarujá (SP). Ele ainda teve a pena aumentada de nove anos e seis meses para 12 anos e um mês de prisão.

A Lei da Ficha Limpa, sancionada pelo próprio Lula durante sua presidência, prevê que candidatos condenados por órgãos colegiados (formados por mais de um juiz) não podem se candidatar. Lula, porém, ainda possui alguns recursos para tentar contornar a categorização como "ficha suja" e tentar concorrer às eleições.

Uma brecha na lei permite que um candidato condenado possa entrar com um pedido de liminar em uma instância superior para tentar concorrer. No caso de Lula, isso deverá ocorrer junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Mas é totalmente imprevisível se Lula vai conseguir essa liminar. No caso de obtê-la, sua defesa vai se defrontar com um problema adicional: a concessão prevê que o próprio recurso contra a condenação passe a tramitar de maneira acelerada. Dessa forma, se Lula insistir em ser candidato, sua defesa pode atrair para o processo uma velocidade indesejada, perdendo a oportunidade de protelar uma decisão final.

RC/ots   | Deutsche Welle

CARTEL DOS AUTOMÓVEIS | Montadoras alemãs vão de um escândalo para o outro


Henrik Böhme (as) | opinião*

Volkswagen, Daimler e BMW são acusadas de usar humanos como cobaias em testes para avaliar efeitos de gases poluentes. Para o jornalista Henrik Böhme, mais uma vez não haverá consequências.

Macacos trancados em pequenas câmaras, nas quais é lançado dióxido de nitrogênio. Pessoas sentadas em salas e submetidas, também, a uma alta concentração do mesmo gás. E tudo isso em nome ou patrocinado por um grupo de pesquisa da indústria automotiva alemã. Claro que, na cabeça de muitas pessoas, cenas como essas criam as mais terríveis associações, por exemplo com as câmaras de gás de Auschwitz-Birkenau, ou com a Ação T4 dos nazistas, o programa de eutanásia que vitimou 70 mil pessoas com deficiências. São lembranças do capítulo mais obscuro da história alemã.

E pensava-se que a coisa não poderia ficar pior para o setor modelo da indústria alemã. O que começou com o dieselgate da Volkswagen nos Estados Unidos espalhou-se depois por outras montadoras, ampliou-se quando a revista Der Spiegel, em meados do ano passado, revelou a maracutaia de anos das montadoras ("o cartel dos automóveis") e alcançou agora um novo patamar.

Mesmo que ainda seja necessário analisar com calma e esclarecer o que de fato ocorreu nesse teste com pessoas e se não se trata de um procedimento experimental inofensivo que acabou sendo exagerado (pessoas saudáveis, três horas no escritório com uma concentração de poluentes que, para quem mora numa rua movimentada, é muito mais intensa), o teste com animais é sobretudo uma coisa: desprezível e simplesmente idiota.

Ou talvez a casa já estivesse pegando fogo de tal maneira na época da série de experimentos com os macacos (2015) que, para as montadoras, tratava-se apenas de tentar ainda salvar a cabeça. Aí, em setembro de 2015, a bomba explodiu, e o dieselgate começou.

Depois da revelação desse novo escândalo pode-se observar sobretudo uma coisa: os rituais bem treinados das montadoras estão funcionando muito bem. A Daimler se apressou a esclarecer que está horrorizada com o que "foi feito em nome da indústria automobilística alemã", distanciou-se e esclareceu que não foram utilizados carros da empresa para a série de testes.

A BMW, claro, também se distanciou, e afirmou ser contra qualquer tipo de testes com animais. E, é verdade, teria sido melhor parar o projeto. Por fim, demorando um pouco mais, a Volkswagen também saiu do seu canto e pediu desculpas, ainda que apenas pelo "comportamento equivocado de alguns". Todas juntas querem agora mandar investigar como se chegou a isso.

Como se chegou a isso? Que pergunta mais idiota. Foram estas três montadoras que, junto com a fornecedora de autopeças Bosch, fundaram em 2007 a Associação Europeia de Pesquisa em Meio Ambiente e Saúde no Setor de Transportes (EUGT). Essa instituição, que nunca foi nada mais que um grupo de lobby com um verniz científico para a campanha de diesel limpo das montadoras alemãs, ordenou a série de testes. Ela também patrocinou o teste em humanos, que originalmente nem havia sido pensado para a indústria automobilística, mas que caía bem, pois "não pôde ser comprovada nenhuma reação à inalação de NO² nas cobaias", como é possível ler no relatório da EUGT.

Na direção dessa ominosa associação de pesquisa – hoje já extinta – estavam, claro, diretores de alto escalão das montadoras. Mas, assim como no caso do dieselgate, também agora a argumentação deverá ser: a chefia não ficou sabendo de nada, apenas um certo grupo de pessoas estava ocupada disso. Algum peixe pequeno será sacrificado, como o diretor da Volkswagen Oliver Schmidt, recentemente condenado nos EUA, e pronto. O resto da tropa lava as mãos, inocente. Montadoras alemãs de automóveis: verdadeiras mestres na arte da trapaça e da enganação.

O curioso nisso tudo é que os consumidores parecem não estar nem aí. A Volkswagen teve um ano recorde em 2017, e a Daimler nada nas glórias de suas excelentes vendas. E, enquanto isso, nas grandes cidades alemãs, pessoas moram em ruas com uma concentração de poluentes no ar que nem macacos nem humanos jamais tiveram que experimentar em testes.

*Deutsche Welle | Henrik Böhme é jornalista de economia da DW

Reino Unido perde em qualquer cenário pós-Brexit, diz estudo


Documento interno do governo, vazado pela imprensa, sugere que saída da UE pode fazer renda nacional britânica cair até 8% nos próximos 15 anos. Sob pressão para divulgá-lo, May alega que estudo é preliminar.

A saída do Reino Unido da União Europeia (UE), o chamado Brexit, terá um impacto negativo à economia britânica em todos os cenários previstos, segundo sugere um relatório interno do governo britânico vazado nesta terça-feira (30/01) pela imprensa internacional.

O estudo é mais um constrangimento para o governo da primeira-ministra britânica, Theresa May, que tem sido alvo frequente de críticas de outros líderes europeus pela ausência de uma estratégia coerente para o Brexit, previsto para se oficializar em 29 de março de 2019.

O documento, divulgado pelo portal de notícias BuzzFeed, afirma que, mesmo que o Reino Unido chegue a um acordo de livre-comércio com a UE após sua saída do bloco, o crescimento econômico nos próximos 15 anos será 5% inferior às estimativas atuais.

Se não existir um acordo, e forem aplicados os termos da Organização Mundial de Comércio, a previsão é pior: a renda nacional cairá 8% nos próximos 15 anos.

O estudo analisa ainda um terceiro cenário: mesmo que o Reino Unido chegue a um acordo para permanecer no mercado comum europeu, haverá queda na renda de ao menos 2%.

O governo britânico já indicou que deve deixar o mercado comum, mas espera negociar um acordo com a UE que possibilite a continuidade do comércio com as menores barreiras possíveis. Ao mesmo tempo, pretende incrementar as trocas comerciais com países terceiros.

O relatório, por outro lado, afirma que os benefícios trazidos por novos acordos bilaterais com países como Estados Unidos, China e Índia não serão suficientes para compensar a perda de receita das trocas com a UE, atualmente o maior parceiro comercial do Reino Unido.

Por fim, o documento sugere que quase todos os setores da economia britânica, com exceção da agricultura, seriam afetados negativamente pelo Brexit, e o status de Londres como centro financeiro seria seriamente abalado.

No Parlamento britânico, membros dos principais partidos, incluindo conservadores e trabalhistas, pressionaram o governo nesta terça-feira a publicar oficialmente o documento, que se junta a outras previsões pessimistas sobre as consequências do Brexit para a economia britânica.

May, no entanto, negou o pedido. Em reunião semanal com seu gabinete, a premiê afirmou que o estudo está ainda em estágio "preliminar" e não leva em conta a opção mais cotada pelo governo para um acordo comercial com a União Europeia. Além disso, segundo ela, divulgar o relatório na íntegra poderia prejudicar as negociações do Reino Unido com o bloco.

"A reportagem é uma interpretação seletiva de uma análise preliminar. É uma tentativa de prejudicar a nossa saída da UE", reforçou Steven Baker, subsecretário de Estado para o Brexit, a parlamentares. "Quando marcarmos o voto sobre o acordo final com a UE, vamos garantir que esta casa terá acesso à análise do governo para que seja tomada uma decisão informada."

A saída do Reino Unido da União Europeia foi aprovada por 51,9% dos britânicos em referendo realizado em julho de 2016, mais de quatro décadas depois de o país aderir ao bloco comunitário europeu. Desde então, o país vem negociando o divórcio com a UE.

EK/ap/rtr/afp/lusa/ots | em Deutsche Welle

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Itália pede estatuto de observador na CPLP


Lisboa, 29 jan (Lusa) - Itália apresentou uma proposta para se tornar observador associado da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), no âmbito do reforço das relações com todos os Estados lusófonos, numa carta a que a Lusa teve hoje acesso.

Na carta, assinada pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Angelino Alfano, o Governo italiano destaca "a consolidação das relações bilaterais com todos os países lusófonos" e dá como exemplo o facto de Itália ser "o país não lusófono com o maior número de cátedras universitárias de língua portuguesa".

"A tradicional vocação italiana para o diálogo, para a mediação e para a integração cultural fazem de Itália um parceiro credível para a comunidade, que, graças à crescente adesão de observadores associados, está a tornar-se cada vez mais um foro de encontro e de diálogo para países de diversas áreas geográficas", refere o Governo italiano, na carta dirigida à secretária-executiva da CPLP, Maria do Carmo Silveira.

Também o principado de Andorra formalizou uma proposta para se tornar observador associado da organização lusófona, intenção anunciada no início de janeiro pelo primeiro-ministro de Andorra, Antonio Martí, em declarações à imprensa depois de um encontro com o homólogo português, António Costa.

A decisão sobre estes pedidos deverá ser tomada na próxima cimeira de chefes de Estado e de Governo da CPLP, que se realiza este ano em Cabo Verde, ainda sem data marcada.

Atualmente, dez países têm o estatuto de observador associado da CPLP: Geórgia, Hungria, Japão, República Checa, Eslováquia, ilhas Maurícias, Namíbia, Senegal, Turquia e Uruguai.

Integram a CPLP Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

VM // PJA

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