quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Angola: NO COMBATE À POBREZA A FOME NÃO SE RESOLVE COM DISCURSOS




A ESTRANHA FÓRMULA DO MINISTRO DA AGRICULTURA

Folha 8 – 22 fevereiro 2014
Angola continua­rá a execu­tar o seu programa de pro­dução alimentar, diversi­ficação da economia e a garantir a segurança ali­mentar, declarou há dias o ministro da Agricultura. O discurso é o mesmo de sempre. Não é de admirar. A realidade também não sofreu alterações.

Afonso Pedro Canga co­mentava a institucionali­zação pela União Africa­na de “2014 como o ano africano da agricultura e da segurança alimentar”, durante a XXII Cimeira de Chefes de Estado da organização realizada em Janeiro, na capital etíope, Addis Abeba.

O ministro reafirmou que estão a ser criadas condi­ções para que os produ­tores (sejam pequenos ou médios) possam explo­rar as potencialidades do país no domínio agrícola, considerando oportuna a iniciativa, uma vez que em África ainda muitas pessoas padecem de fome, bem como da necessidade de unir sinergia para aca­bar com a fome no conti­nente.

Segundo o ministro, “An­gola está num bom cami­nho na medida em que no ano passado foi um dos países que reduziu o nú­mero de pessoas afectadas pela fome, tendo inclusive sido premiado pela FAO por este feito”.

“Nós vamos continuar o trabalho com mais deter­minação até, naturalmen­te, acabar com a fome”, declarou o ministro, certa­mente depois de um lauto almoço que, como se sabe, é obrigatório para depois se falar da fome… dos ou­tros.

Pedro Canga salienta que o facto de a União Afri­cana consagrar “2014 ano africano da agricultura e segurança alimentar, é reconhecimento de que é necessário investir na agricultura para combater a fome, a pobreza e para diversificar a economia africana”.

O mesmo ministro anun­ciou em Agosto de…. 2008 a criação dos pólos de de­senvolvimento agrícola, nos municípios do Kuito Kuanavale, Kuchi, Mavin­ga e outras áreas, na pro­ víncia do Kuando-Kuban­go, a partir de 2009.

Em declarações à impren­sa, o ministro afirmou então que haverá produ­ção de cereais em grande escala, crescimento da pecuária, bem como de in­dústrias açucareira e olea­ginosa, com vista ao maior desenvolvimento econó­mico na província.

Afonso Pedro Canga dis­se, sem avançar ainda os valores monetários a em­pregar nestes “megas pro­jectos”, que estará resolvi­do apenas para um estudo pormenorizado dos mes­mos, com vista a arrancar com as empreitadas do ramo de agricultura, no Kuando Kubango, no pró­ximo ano, 2009.

Durante a sua permanên­cia de dois dias ao Me­nongue, o ministro que chefiava uma delegação do seu Ministério, visitou na altura os projectos em curso, nomeadamente o Canal de Irrigação do Missombo, com três qui­lómetros da primeira fase já finalizados.

Acompanhado pelo go­vernador da província, João Baptista Tchindandi, visitou a segunda fase do referido canal, com três quilómetros, com previ­sões de beneficiar mais de 1.500 camponeses, já com término previsto em De­zembro de 2008.

A empreitada, a cargo da empresa de construção civil portuguesa, Cons­truMenongue, contem­plava a construção de um reservatório de água com a capacidade de dois mil trezentos metros cúbicos.

Canga disse na altura que ss factores agrícolas para a campanha 2008/2009 já estavam no Kuando Ku­bango, para serem distri­buídos aos camponeses locais, onde constam 50 toneladas de sementes de milho, 15 de adubo, 22 de amónio, 20 de ureia, 315 charruas e 315 correntes, a par de outros imputes.

Quando em Junho do ano passado a FAO homena­geou Angola pelos supos­tos êxitos no combate à fome, o titular da Agricul­tura recordou que, logo após o fim do conflito, em 2002, o Governo im­plementou com êxito um vasto e complexo progra­ma de reassentamento das pessoas deslocadas e refu­giadas, por causa da guer­ra, e um programa de rein­serção social, económica e produtiva de milhares de ex-militares.

Neste âmbito, disse o mi­nistro, regressaram para as zonas de origem ou de preferência mais de qua­tro milhões de pessoas que começaram a pro­duzir os seus alimentos e deixaram de depender da ajuda alimentar.

Do mesmo modo, a agri­cultura familiar foi redina­mizada e apoiada técnica e financeiramente, pro­ duzindo alimentos para o consumo e para a renda da família. E as crianças e jovens nas escolas rece­bem uma merenda, acres­centou.

Para Afonso Canga, o re­conhecimento da FAO en­coraja (como se isso fosse preciso) o Governo an­golano a prosseguir com mais dinamismo e deter­minação nos esforços de reconstrução nacional, visando satisfazer as ne­cessidades e as aspirações justas dos angolanos, em particular, o direito à ali­mentação.

“O Executivo angolano, liderado pelo engenheiro José Eduardo dos Santos, vem aumentando, anual­mente, os orçamentos destinados à segurança alimentar e nutrição, à saúde, à educação, à as­sistência social e ao com­bate à pobreza”, disse o ministro, sublinhando que a produção alimentar tem conhecido aumentos, os níveis de emprego têm subido, os índices de po­breza estão a reduzir e a esperança de vida dos an­golanos está a aumentar.

O ministro da Agricultu­ra lembrou, entretanto, o longo caminho por per­correr para erradicação da fome e da pobreza, no mundo. Por esta razão, su­blinhou, todos os meios e esforços devem ser mobi­lizados para a erradicação deste flagelo, que insisten­temente persegue a huma­nidade, há séculos.

Ora, dando azo à filan­trópica vontade de pôr o mundo em ordem, o ministro de Eduardo dos Santos reafirmou o com­promisso de Angola e do seu Governo de estar na linha da frente neste combate, ao lado de ou­tros países e organizações, para que ao nível nacional, regional e internacional se possa alcançar níveis de segurança alimentar acei­táveis.

O ministro foi muito aplaudido quando rendeu uma especial homenagem às mulheres que “são as principais produtoras de alimentos para a família no meu país e no mundo. Sem a sua participação e entrega os resultados se­riam diferentes”.

Nem mais. Aliás, por todo o mundo ocidental se sabe que, citando o ministro Afonso Pedro Canga, são “as mulheres as principais produtoras de alimentos”. A agricultura é, de facto, uma actividade feminina, como é fácil de constatar na Alemanha, nos EUA, no Reino Unidos etc.

Entretanto, a África sub­-saariana deverá registar até 2017 um aumento de mais de 50% do actual dé­fice alimentar, e nenhum país lusófono evitará a tendência, segundo dados da agência governamen­tal norte-americana para a Agricultura. Nada de novo, dirão os que têm fartura como é, no nosso caso, o principal respon­sável pela política agricola.

Os dados do Departamen­to dos Estados Unidos para a Agricultura (USAD), in­dicam que Cabo Verde e Angola eram em 2007 os países lusófonos africanos que apresentavam uma mais baixa diferença entre a quantidade de alimentos disponíveis (produzidos e importados) e as suas necessidades - respectiva­mente, sete mil de tonela­das e 47 mil toneladas.

Mas, segundo os dados da USAD, o défice cabo­-verdiano aumentará seis vezes até 2017, para 41 mil toneladas, enquanto o an­golano crescerá cerca de um terço, para 66 mil tone­ladas.

Pior é a situação nos ou­tros dois países lusófo­nos incluídos no estudo - Guiné-Bissau (de 219 mil toneladas para 362 mil) e Moçambique (de 154 mil toneladas para 211 mil).

“Até 2017, a África Sub­-Saariana terá mais pes­soas em situação de inse­gurança alimentar do que a Ásia - 645 milhões, em comparação com 487 mi­lhões. Por outras palavras, dada a actual tendência, a região albergará mais de metade das pessoas mal­-nutridas abrangidas por este relatório”, apesar de ter menos população, re­fere a USAD.

Angola e Cabo Verde incluem-se no grupo de países que importam mais de 50% dos cereais que consomem, enquanto em Moçambique e em Cabo Verde esta percentagem situou-se entre os 30% e os 50% nos últimos anos.

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