segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Portugal: ALEMÃES QUEREM EVITAR JULGAMENTO DO PROCESSO DOS SUBMARINOS

 

Paulo Alexandre Amaral - RTP
 
O dossier das contrapartidas no negócio dos submarinos, em 2004, entre o Estado português e o consórcio alemão GSC (German Submarine Consortium) regressa hoje aos tribunais portugueses, nas Varas Criminais do Campus da Justiça, em Lisboa, para sentar no banco dos réus três administradores da Man Ferrostaal e sete empresários portugueses. Estão acusados de falsificação de documentos e burla qualificada. A defesa dos alemães pretende parar o julgamento, invocando a revisão, em outubro, do contrato de contrapartidas. Na Alemanha, o processo da venda de submarinos a Portugal e Grécia levou em 2011 à condenação de dois ex-executivos da Ferrostaal por suborno de funcionários públicos estrangeiros. A empresa pagou 140 milhões de euros por práticas ilegais.
 
Em 2004, na vigência do Executivo do primeiro-ministro Durão Barroso, o Estado português contratualizou a compra de dois submarinos à GSC (consórcio constituído pela Man Ferrostaal, Thyssen-Nordseewerke e Howaldtswerke-Deutsche Werft HDW). É um negócio que está envolvido em suspeitas de corrupção e incumprimentos que levaram à abertura de dois processos em Portugal, numa investigação que se vem arrastando ao longo dos anos.
 
De acordo com o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), a Justiça segue duas vias neste processo: por um lado, saber o que se passa com as contrapartidas do negócio; por outro, pretende apurar "eventuais ilícitos de corrupção", que estariam relacionados com as condenações na Alemanha.

O julgamento que arranca esta segunda-feira diz respeito à parte das contrapartidas. Em Outubro de 2009 foi deduzida acusação contra dez arguidos, três alemães e sete portugueses: são eles José Pedro Sá Ramalho, Filipe Soares Moutinho, António Luís Parreira Holterman Roquete, Rui Paulo Moura Santos, Fernando Costa Gonçalves, António João Jacinto e José Mendes Medeiros. Os arguidos alemães são Horst Weretecki e Antje Malinowski, da Ferrostaal, e Winfried Hotten.

Sobre o conjunto destes dez arguidos recai a acusação de falsificação de documento e burla qualificada ao Estado no valor de quase 34 milhões de euros.

Simulação de novos negócios que já eram velhos

Com a celebração do contrato entre o Estado português e o consórcio alemão, a 21 de abril de 2004, o capítulo das contrapartidas face à compra dos dois submarinos à GSC obrigava à aplicação de parte do dinheiro em Portugal, mas, contas feitas, a economia portuguesa não terá ganho o que era então suposto ganhar.

De acordo com o Ministério Público, com a compra dos submarinos por mil milhões de euros, os alemães deveriam levar a cabo um programa de ajuda à indústria portuguesa, para que gerasse negócios na ordem dos 1200 milhões de euros. Mas o que aconteceu foi uma simulação de contrapartidas em negócios na realidade inexistentes, com as partes a tirarem vantagem de negócios que já estavam em curso entre empresas portuguesas e empresas alemãs.

Defesa dos alemães quer ver julgamento anulado

A defesa dos alemães já fez saber que pretende a anulação do julgamento, para o que entregou um requerimento ao coletivo de juízes. Godinho Matos, advogado da parte alemã, sustenta que em outubro passado foi assinado novo contrato de contrapartidas entre a Man Ferrostaal e o Estado português, o que – na sua opinião – esvazia de sentido este julgamento.

Por ter deixado de haver danos para o Estado português com a nova redação, isso veio "extinguir a responsabilidade criminal dos arguidos", sustenta o causídico.

A acusação já antes sofreu ataques, mormente na fase de instrução. Nessa altura o juiz Carlos Alexandre validaria a acusação do Ministério Público, não dando seguimento ao pedido da defesa alemã no sentido da sua anulação. Um dos argumentos invocados era o da alegada falta de isenção da peritagem feita pela empresa INTELI, um caso que levantou na altura forte polémica por ter como pano de fundo o envolvimento amoroso entre o presidente da INTELI, Rui Felizardo, e Carla Dias, magistrada do Ministério Público que assessorou a investigação no DCIAP.

Várias pedras no caminho da investigação

A investigação do Ministério Público incide sobre eventuais ilícitos de corrupção, tráfico de influência e prevaricação na compra dos submarinos “Tridente” e “Arpão” ao GSC, um negócio que custou ao Estado cerca de mil milhões de euros. De acordo com o DCIAP, o processo “prossegue os seus termos, aguardando-se resposta a diversas cartas rogatórias emitidas para vários países”.

Há poucos meses, o DCIAP emitia um comunicado que dava conta de várias diligências realizadas entre abril de 2008 e novembro de 2009, com os investigadores a analisarem documentos dispersos por diferentes departamentos do Ministério da Defesa. Um comunicado que acrescentava continuar “a faltar o dossier histórico contendo a documentação relativa aos concursos que antecederam a celebração dos contratos, contrapartidas e financiamentos”.

Num despacho de 4 de junho, que ditou o arquivamento do inquérito que incidia sobre o advogado Bernardo Ayala, o procurador João Ramos, do DCIAP, escrevia que, “apesar de todos os esforços e diligências levadas a cabo pela equipa de investigação, o certo é que grande parte dos elementos referentes ao concurso público de aquisição dos submarinos não se encontra arquivada nos respetivos serviços, desconhecendo-se qual o destino dado à maioria da documentação”.
 

Sem comentários:

Mais lidas da semana