sexta-feira, 25 de outubro de 2013

PORTUGAL PAGA POR UM ERRO DO FMI

 


O Fundo Monetário Internacional é criticado por uma ex-diretora no Departamento Europeu. O erro foi ter alterado as suas próprias regras relativas à sustentabilidade da dívida pública dos países resgatados.

Jorge Nascimento Rodrigues - Expresso
 
"A crise do euro levanta profundas dúvidas sobre a independência do Fundo Monetário Internacional (FMI)", diz Susan Schadler, ex-diretora-adjunta do Departamento Europeu do Fundo entre 1999 e 2007, num artigo sugestivamente intitulado "Unsustainable Debt and the Political Economy of Lending: Constraining the IMF's role in Sovereign Debt Crisis" ("Dívida insustentável e Economia Política dos Empréstimos: Restringindo o papel do FMI na crise da dívida soberana", CIGI Papers, Outubro 2013). Schadler trabalhou no FMI desde 1976.
 
O principal pecado da organização foi ter alterado uma das regras fundamentais da sua atuação quando se envolveu com a União Europeia e o Banco Central Europeu na gestão da crise das dívidas soberanas de alguns países periféricos da zona euro. E cometeu o pecado por ter sucumbido às pressões dos parceiros europeus.
 
A "mudança fundamental" nas regras que afeta uma "perspetiva sistémica" sobre a atuação futura do FMI tem a ver com "a decisão de emprestar à Grécia, Irlanda e Portugal sem ter acordado num caminho convincente para um nível de dívida que se possa gerir", diz Schadler, que trabalha atualmente no Center for International Governance Innovation em Waterloo, no Canadá, e no Atlantic Council, em Washington DC, nos EUA.
 
O erro já foi apontado em trabalhos dos próprios técnicos do FMI a propósito do balanço da gestão do resgate à Grécia. "Debaixo de pressão por parte dos parceiros europeus, no quadro da troika, um arranjo muito pouco comum, o FMI introduziu a possibilidade de renúncia ao segundo dos seus quatro critérios: no caso de haver o risco de impactos internacionais, não é necessário garantir que há uma alta probabilidade de sustentabilidade da dívida", diz a especialista, na sequência do que técnicos do FMI disseram recentemente. A revisão da norma foi invocada subsequentemente, diz Schadler, para os casos da Irlanda e de Portugal.
 
O que isto significou é que a reestruturação da dívida grega foi afastada no início e só dois anos depois da primeira tranche de empréstimo concedido pelo FMI, já numa situação limite, foi concretizada. "Portugal até pode passar sem uma reestruturação, mas pagará por uma incerteza prolongada com uma retoma muito mais longa do que seria necessário. A Irlanda parece estar a recuperar, mas, uma vez mais, com custos severos para a atividade económica do que se o problema do sobre-endividamento tivesse sido analisado no início", diz a especialista que foi economista do Departamento do Tesouro norte-americano.
 
Susan Schadler insiste que a regra deve ser reposta e que o FMI deverá abrir uma possibilidade de uma facilidade financeira de muito curto prazo, de preferência financiada pelos bancos centrais, em circunstâncias de emergência.
 

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