O Fundo Monetário
Internacional é criticado por uma ex-diretora no Departamento Europeu. O erro
foi ter alterado as suas próprias regras relativas à sustentabilidade da dívida
pública dos países resgatados.
Jorge Nascimento Rodrigues - Expresso
"A crise do
euro levanta profundas dúvidas sobre a independência do Fundo Monetário
Internacional (FMI)", diz Susan Schadler, ex-diretora-adjunta do
Departamento Europeu do Fundo entre 1999 e 2007, num artigo sugestivamente
intitulado "Unsustainable Debt and the Political Economy of Lending:
Constraining the IMF's role in Sovereign Debt Crisis" ("Dívida
insustentável e Economia Política dos Empréstimos: Restringindo o papel do FMI
na crise da dívida soberana", CIGI Papers, Outubro 2013). Schadler
trabalhou no FMI desde 1976.
O principal pecado
da organização foi ter alterado uma das regras fundamentais da sua atuação
quando se envolveu com a União Europeia e o Banco Central Europeu na gestão da
crise das dívidas soberanas de alguns países periféricos da zona euro. E cometeu
o pecado por ter sucumbido às pressões dos parceiros europeus.
A "mudança
fundamental" nas regras que afeta uma "perspetiva sistémica"
sobre a atuação futura do FMI tem a ver com "a decisão de emprestar à
Grécia, Irlanda e Portugal sem ter acordado num caminho convincente para um
nível de dívida que se possa gerir", diz Schadler, que trabalha atualmente
no Center for International Governance Innovation em Waterloo, no Canadá, e no
Atlantic Council, em Washington DC, nos EUA.
O erro já foi
apontado em trabalhos dos próprios técnicos do FMI a propósito do balanço da
gestão do resgate à Grécia. "Debaixo de pressão por parte dos parceiros
europeus, no quadro da troika, um arranjo muito pouco comum, o FMI introduziu a
possibilidade de renúncia ao segundo dos seus quatro critérios: no caso de
haver o risco de impactos internacionais, não é necessário garantir que há uma
alta probabilidade de sustentabilidade da dívida", diz a especialista, na
sequência do que técnicos do FMI disseram recentemente. A revisão da norma foi
invocada subsequentemente, diz Schadler, para os casos da Irlanda e de
Portugal.
O que isto
significou é que a reestruturação da dívida grega foi afastada no início e só
dois anos depois da primeira tranche de empréstimo concedido pelo FMI, já numa
situação limite, foi concretizada. "Portugal até pode passar sem uma
reestruturação, mas pagará por uma incerteza prolongada com uma retoma muito
mais longa do que seria necessário. A Irlanda parece estar a recuperar, mas,
uma vez mais, com custos severos para a atividade económica do que se o
problema do sobre-endividamento tivesse sido analisado no início", diz a
especialista que foi economista do Departamento do Tesouro norte-americano.
Susan Schadler
insiste que a regra deve ser reposta e que o FMI deverá abrir uma possibilidade
de uma facilidade financeira de muito curto prazo, de preferência financiada
pelos bancos centrais, em circunstâncias de emergência.
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