quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Portugal: REVOLTA TRANSFORMADA EM ALTERNATIVA

 


Nuno Ramos de Almeida* – i online, opinião – foto Manuel Vicente
 
Em Portugal não se contesta apenas um programa económico que serve muito poucos, nas ruas é a própria democracia, como a conhecemos, que está em causa
 
Não vivemos só uma grave crise económica, atravessamos uma profunda crise política. A democracia representativa deixou de funcionar. Há muito que os eleitores perceberam em Portugal que as eleições deixaram de ser escolhas. Os partidos do arco do governo, vulgo centrão, representam alternâncias de camisola para garantirem a continuidade dos negócios de um capitalismo que cresceu à custa do contribuinte. Os grandes lucros são dos accionistas, os enormes prejuízos são amavelmente distribuídos pelos cidadãos.
 
O actual programa do PSD, CDS e da direcção do PS é o mesmo e chama-se: Memorando da troika.
 
É simbólico que no meio da maior crise existente a única proposta do líder do chamado “maior partido da oposição” seja diminuir o número de deputados. Como se a garantia de uma economia justa passasse por ter um parlamento só com representantes do PS e do PSD. Esta iniciativa tem um objectivo claro: calar administrativamente as vozes que se opõem no parlamento a este caminho de catástrofe.
 
Vivemos um tempo de revolta; as manifestações do 15 de Setembro demonstram que as pessoas se aperceberam de que as políticas do governo, ditadas por Berlim, não passam de uma forma de suicídio assistido. Qualquer pessoa que não esteja cega pelos óculos do neoliberalismo sabe que este plano significa o empobrecimento de muitos e grandes lucros para muito poucos.
 
A escolha está em aceitar a miséria para muitas gerações ou recusar este caminho.
 
A grande dúvida é se a democracia conseguirá funcionar de modo a expressar este descontentamento e permitir que a revolta se transforme em alternativa.
 
Para muitas pessoas o que está a falhar não são só os governos do bloco central mas a própria democracia. As acusações aos políticos em geral, os argumentos populistas são a prova de que muitos não vêem a diferença de responsabilidades. Se percebem que os governos portugueses foram maus para a população e bons para os amigos, não conseguem acreditar que PCP e Bloco de Esquerda podem ser o veículo de uma alternativa política e de poder. E provavelmente têm razão. Este governo deve ser demitido, o povo tem de ser chamado a decidir o seu futuro, mas PCP e Bloco de Esquerda são demasiado pequenos para ambicionar ser governo.
 
É preciso construir uma alternativa que possa ir a votos para ganhar. Só uma força que junte independentes contra a troika, comunistas e bloquistas pode triunfar. Há um longo caminho a percorrer para conseguir este cenário e muito pouco tempo para o fazer. Se ele não existir, a democracia tal como a conhecemos não vai expressar o simples facto de a população portuguesa estar contra o Memorando da troika.
 
O pensador francês Rancière divide a política em duas categorias: “polícia” quando se limita a administrar aquilo que existe e “política” quando aqueles que não têm voz tomam a palavra e empreendem acções num sentido de se conseguir uma maior igualdade.
 
É preciso pois uma política que dê voz à maioria dos portugueses e isso exige não só um outro governo, mas uma democracia muito diferente.
 
* Editor-executivo
 
Escreve à terça-feira
 

1 comentário:

Anónimo disse...

ATENTEM NOS EXEMPLOS DA VENEZUELA, DA ALBA, DO MERCOSUR E DA UNASUR!!!

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