"Enquanto
a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência construiu um grupo de trabalho
que transformou as propostas da FENAJ, [realizou a] criação de um Observatório
Nacional e a indicação da aprovação de uma lei que federalize as investigações
de crimes contra comunicadores, o Ministério da Justiça ignorou os pedidos de
audiência insistentes da FENAJ"
Marcela
Belchior, Adital – em Brasil De Fato
A
intensificação de protestos nas ruas do Brasil desde as Jornadas de Junho de
2013, passando pela Copa do Mundo FIFA 2014 e com tendências a prosseguir no
país, tem colocado novamente em pauta a questão da violência contra
jornalistas, diante do registro de diversos casos. O tema ainda não é tratado
como se deve no Brasil. Empresas não garantem a proteção necessária aos seus
funcionários e o Estado brasileiro ainda se utiliza de métodos repressivos para
conter os avanços das vozes dissonantes ou que coloquem em evidência as falhas
do Poder Público.
Relatório
publicado pela organização não governamental Artigo 19, que defende a
liberdade de expressão e informação, aponta que, durante os protestos ocorridos
no ano passado, no Brasil, não somente os manifestantes foram vítimas de ações
violentas por parte de agentes do Estado. A Polícia Militar cometeu graves
violações contra jornalistas e outros profissionais de comunicação, que cobriam
atos públicos em todo o Brasil, na tentativa de impossibilitar que a cobertura
e o registro da violência policial prosseguissem.
O
levantamento mostra que a imprensa também sofreu violência verbal e física por
parte dos manifestantes. Houve casos em que profissionais de veículos de
comunicação foram hostilizados por cidadãos comuns e, até mesmo, expulsos do
interior da concentração de manifestantes. Somente naquele mês de junho, houve
117 registros de jornalistas agredidos e feridos e outros 10 detidos, incluindo
as mídias tradicionais e alternativas.
Para
tratar dessa questão, a Adital entrevistou o presidente da Federação
Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Celso Schröder. Ele discute como o é, como
deve ser tratada e quais demandas que a violência contra jornalistas gera hoje
no país. Para ele, as instituições públicas, até bem pouco tempo atrás,
simplesmente ignoravam o problema ou contribuíam para a impunidade ao não darem
continuidade aos processos policiais ou judiciais, podendo a violência contra o
jornalista se dar desde o assédio até o assassinato.
ADITAL
- O que pode ser considerado violência contra jornalistas?
Celso
Schröder - Qualquer ato que coloque em risco a vida, a segurança ou o
trabalho do jornalista. A violência pode ter vários níveis e diversos tipos.
Desde o assédio até o assassinato. Desde a violência física até o
constrangimento moral.
ADITAL
- A violência contra jornalistas pode ser considerada ato de censura ao
trabalho da imprensa?
CS -
Embora a palavra censura tenha uma definição precisa, na qual o Estado impede,
de maneira a priori, a circulação de informação ou opinião, é possível
fazer uma analogia entre o constrangimento de fazer o jornalismo, desde que
intencional, e a censura. A violência sempre tem a intenção de inibir e impedir
o jornalismo.
ADITAL
- De que maneira as instituições públicas vêm tratando a questão?
CS -
De uma maneira geral, as instituições públicas ou ignoravam o problema ou
contribuíam para a impunidade, ao não darem continuidade aos processos
policiais ou judiciais. O assassinato de jornalistas tem aumentado no mundo
todo, principalmente [depois] do ataque estadunidense ao Hotel Palestina, no
início da Guerra do Iraque, quando a imprensa deixou de ser vítima ocasional
para se transformar em alvo.
No
Brasil, nos últimos anos, os números cresceram assustadoramente. Desde crimes
por encomendas aos crimes a partir das chamadas manifestações de junho [de
2013]. O governo brasileiro agiu de maneira ambígua. Enquanto a Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência [da República] construiu um grupo de trabalho
que transformou as propostas da FENAJ, [realizou a] criação de um Observatório
Nacional e a indicação da aprovação de uma lei que federalize as investigações
de crimes contra comunicadores, o Ministério da Justiça ignorou os pedidos de
audiência insistentes da FENAJ.
ADITAL
- As empresas jornalísticas ainda não demonstram estarem preparadas para
garantirem proteção a seus profissionais de mídia, que ficam, frequentemente,
vulneráveis a casos de violência durante o exercício da profissão. Como
estimular essa necessidade dentro das redações?
CS -
A FENAJ propõe um protocolo a ser firmado pelas empresas em nível nacional e a
Federação com os seguintes itens: seguro de vida e saúde para aqueles
jornalistas que estiverem em situação de risco; equipamentos e treinamento
adequados para o nível do risco; constituição de uma comissão de segurança para
avaliar pautas e estudar pertinência e formas de cobertura.
ADITAL
- Recentemente, acompanharam-se casos de prisões de repórteres que registravam
ações da Polícia Militar durante manifestações da população nas ruas
brasileiras, aparentemente sem justificativa fundamentada. O que justificaria a
prisão de um jornalista?
CS -
Pedimos uma audiência com o Ministério da Justiça, que criou um grupo de
trabalho, mas que não atendeu ao pedido da FENAJ de fazer uma manifestação
exigindo das policiais militares, principalmente, o fim das agressões aos
jornalistas.
ADITAL
- A violência ao profissional de mídia praticada pelo Estado deve ser tratada
de maneira diferente dos casos relacionados ao setor privado, por exemplo? De
que maneira?
CS -
Os crimes devem ser denunciados, investigados e punidos igualmente. Os crimes
realizados pelo Estado tem o agravante de serem oriundos de um ente social com
o monopólio da força atribuído pela própria sociedade.
ADITAL
- Como um jornalista deve proceder no caso de sofrer agressão?
CS -
Exercitar os treinamentos, se utilizar dos equipamentos, seguros e proteções
que deverão ser garantidos pelos empregadores. Trabalhar em sintonia com as
entidades sindicais dos jornalistas e organizações de direitos humanos para o
caso.
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