António Galamba – jornal i, opinião
Nada apaga a
realidade concreta e insustentável dos portugueses que estão a ficar para trás.
Não há foguetório a 17 de Maio que justifique tamanha falta de humanismo
Há um traço de
contradição permanente que marca a governação da maioria PSD/CDS, sempre
pontuada pela lógica negativa de não olhar aos meios para tentar atingir determinados
fins.
As contradições
começaram logo após a eleição, com os cortes nos salários e nos subsídios de
férias e de Natal, quando em campanha eleitoral asseguraram que não seria
necessário "em Portugal cortar mais salários nem despedir gente para poder
cumprir um programa de saneamento financeiro". Chegaram a afirmar que
mexer no subsídio de férias era "um disparate". Viu-se.
Incoerência quando
se desmantela a rede consular que presta apoio aos portugueses residentes fora
do território nacional e se aponta a emigração como caminho para a falta de
oportunidades em Portugal.
Incoerência quando
se corta na educação, na investigação e na inovação e se tem um discurso de
defesa das exportações.
Incoerência quando
se corta nas bolsas de investigação e se deixa sair do país milhares de jovens
qualificados e depois querem que o Alto Comissariado para a Imigração e o
Diálogo Intercultural (ACIDI) alicie estrangeiros "de elevado potencial"
a virem para Portugal.
Incoerência quando,
por preconceito, o ministro Crato abandona o projecto do computador português
Magalhães, preferindo distribuir numa escola computadores Samsung, que são a
concorrência portuguesa na Venezuela, pondo em risco as exportações da
diplomacia económica do Dr. Portas.
Incoerência quando
o primeiro-ministro e os seus acólitos vão alternando dispensas dos contributos
do Partido Socialista e chumbos de propostas no parlamento, com apelos
lancinantes ao diálogo e ao compromisso em torno da sua visão de cortes cegos.
Há mais de dois
anos e meio que PSD e CDS governam numa espécie de buraco negro. Há um passado
que é desculpa para os fracassos do presente e um futuro em que tudo será menos
mau.
Há mais de dois
anos e meio que a maioria insiste numa lógica de divisão dos portugueses, os
que ainda trabalham no sector privado contra os que ainda trabalham no sector
público; os jovens desempregados e sem perspectiva de Estado social no presente
e no futuro contra os menos jovens ou os que não têm algo mas gostavam de ter,
contra os que têm. Pôr uns portugueses contra outros até pode gerar a inveja e
o sentimento de pretensa justiça que suscita a adesão de uns e a oposição de
outros, mas nunca mobilizará os portugueses.
Há mais de dois
anos e meio que se afirma que a consolidação das contas públicas deveria ter
subjacente políticas concretas para o emprego e o crescimento económico. A
maioria, que sempre apostou na cultura do negativismo, da divisão e dos cortes
cegos, exulta agora por qualquer sopro positivo que surja. Nas exportações,
pelo peso dos combustíveis no seu aumento, até parece que descobrimos petróleo,
mas é "apenas" a refinaria de Sines a funcionar. Na diminuição do
desemprego, omite-se a emigração de mais de 240 mil portugueses e o facto de a
maior parte do emprego criado ser relativo a ocupações de uma a dez horas
semanais.
O desespero da
maioria em mostrar--se o bom aluno e da Europa em ter um bom exemplo até pode
mascarar os fracassos no défice, na dívida, no desemprego e as consequências
trágicas da estratégia de empobrecimento de Portugal, mas nada apaga a
realidade concreta e insustentável dos portugueses que estão a ficar para trás.
Não há foguetório a 17 de Maio que justifique tamanha falta de humanismo.
Político (PS) - Escreve
às quintas-feiras
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