quarta-feira, 8 de julho de 2015

FOI VOCÊ QUE PEDIU ESTA EUROPA?



João Gonçalves* - Jornal de Notícias, opinião

O referendo grego teve, entre outros, o mérito de confirmar algumas suspeitas. Quer sobre nós, portugueses, quer sobre aquilo que passa por "Europa" e que, na língua de pau em vigor, se traduz na marca branca "instituições". Às da "Europa" soma-se o descaracterizado FMI da sra. Lagarde, a "adulta" dos solários a qual, sem um pingo de moral política desde que foi ministra de Sarkozy, é acólita matriculada na desgraça em curso. Por aqui, as circunstâncias eleitorais explicaram parte do desvario jubilatório das esquerdas e da intimidação timorata das direitas. E o "carácter nacional", espalhado em muito comentadorismo, nas redes sociais e em algumas prosas do jornalismo oficioso, o resto: "dureza" e grosseria. Paulo Rangel perguntava ontem, num artigo no Público, "Grécia, Grécia, por que nos abandonaste", presumivelmente na sua recente qualidade de substituto de Alexandra Solnado na interlocução directa com Jesus. E o primeiro-ministro, mais terreno e jurado praticante do tratado orçamental, sugeria que cabia à Grécia escolher.

Ou seja, apontou-lhe delicadamente a luz de presença "saída" na lógica, aliás, da aritmética do doutor Cavaco. Ora como preveniu Medeiros Ferreira em Abril de 2012, o Tratado Orçamental foi feito para dividir a Europa e não para a unir. É também isso que revela a tagarelice e a mesquinhice de muitas destas reacções ao transe grego o qual, lá por ser grego, não deixa de ser sobretudo europeu. Os sonsos das "instituições" - com Dijsselbloem à cabeça, Draghi nas mãos, Schulz no tronco e Juncker nos pés -, no lastro de um Conselho Europeu composto por impotentes políticos, activos ou passivos, espelham bem a inexistência de um pensamento sobre o futuro da União. Primeiro, cativa da alacridade dos Tratados desde 1992 e, agora, exclusivamente subordinada ao Tratado Orçamental de 2012 que apenas serviu para aumentar a desconfiança entre estados-membros.

O episódio grego decorre fundamentalmente disto e do colapso de décadas de governações falaciosas caídas com estrondo sobre o perplexo e porventura impreparado Tsipras que não hesitou na imolação de Varoufakis. Porque (e volto a pedir emprestadas palavras a Medeiros Ferreira) "neste momento as instituições europeias não funcionam, nem dentro nem fora dos Tratados" dado "o erro inicial da fuga à vontade dos povos e ao escrutínio democrático a nível europeu". Obama e Putin não são meros observadores. Foi você que pediu esta Europa? Eu não.

O autor escreve segundo a antiga ortografia - *Jurista

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