quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Portugal-Angola: A BEM DA RAZÃO

 

Eduardo Oliveira Silva - Jornal i, opinião
 
É preciso desarmadilhar o terreno das relações luso-angolanas
 
As relações entre Angola e Portugal têm por definição uma faceta fraterna e outra de tensão natural. Não é de estranhar que assim seja. Os laços históricos que existem começaram por ser forjados pela imposição de uma subjugação colonial. A uma guerra de libertação seguiu- -se uma descolonização penosa e, por fim, o patamar de relativa normalidade foi conseguido a partir do momento em que terminou a guerra civil e Angola alcançou a paz para entrar no de- senvolvimento. Isso permitiu que Portugal crescesse como parceiro privilegiado, obtendo proveitos gradualmente mais valiosos e abrindo horizontes de trabalho para milhares dos seus nacionais.
 
Naturalmente, o desenvolvimento de Angola deu origem a uma capacidade de internacionalização da sua economia que, exactamente por causa de laços absolutamente únicos entre os países, se dirigiu primeiro para Portugal, o qual, entretanto, também intensificou os seus investimentos em Angola.
 
Há portanto uma sintonia e um envolvimento económico que interessa sobremaneira aos dois países e aos seus cidadãos em concreto.
 
Ora nos últimos meses essa tranquilidade foi objectivamente perturbada por informações e notícias dando conta de que há personalidades angolanas a ser investigadas pela justiça portuguesa a partir de denúncias feitas cá por angolanos.
 
Seja português, seja chinês, angolano, espanhol, coreano do Sul ou do Norte, qualquer indivíduo tem o direito de se indignar com esse tipo de situação e com flagrantes violações do segredo de justiça, das quais os media são os menores responsáveis, pois não são eles que têm acesso directo ao que quer que seja.
 
E foi isto e só isto que indispôs Angola e as personalidades visadas, que, legitimamente, reagem e suscitam intervenções de Estado com base no pressuposto de inocência até prova em contrário que é próprio da justiça justa.
Entre nós não estamos habituados a que quem seja posto na berlinda tenha publicamente a capacidade de reagir com meios e mecanismos de diversa ordem, inclusivamente económicos.
 
Mas é evidente que quem vê o seu nome atirado para a praça pública e cozinhado em lume brando em função de diligências judiciais e judiciosamente mediatizadas pode não se conformar e pode reagir, se tiver ao seu alcance meios de resposta que evitem que tenha de se sujeitar a determinado tipo de vexames e controlos remotos de quem quer que seja.
 
Este imbróglio que vivemos tem três planos: o da justiça, que se arrasta e não resolve; o da política globalmente falando, que por um lado procura evitar rupturas excessivas, mas por outro incita ao confronto; e o da economia e da dimensão humana, que procura seguir em frente em Portugal e Angola, evitando consequências funestas e rupturas drásticas por via da dramatização de momentos pontualmente complexos dentro de uma longa e nem sempre fácil história comum.
 
São poderes independentes uns dos outros, mas é bom que haja consciência de que cada um dos seus agentes interage directamente com os outros e tem responsabilidades acrescidas em relação à sua singela esfera de actuação.
 
É pois desejável que cada um actue com diligência, rapidez e clareza na sua área, não deixando terrenos armadilhados no caminho dos outros, sob pena de prejudicar uma vastíssima comunidade de dois países entrosados a tal ponto que as suas gentes muitas vezes se confundem até não se distinguir quem é de onde.
 

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