Fernanda
Câncio – Diário de Notícias, opinião
Esta
semana, várias pessoas quiseram dizer que acreditam no PM ou, pelo menos, lhes
custa muito a aceitar o contrário. Houve até quem escrevesse que "o
cidadão Pedro Passos Coelho justifica mais que o benefício da dúvida. Justifica,
nesta matéria, o benefício da confiança."
Foi
o diretor do Diário Económico, António Costa, que isto disse. Ora, sendo claro
que o PM chegou ao poder a prometer tudo ao contrário do que fez nestes três
anos e dois meses de exercício, durante os quais continuou alegremente a (entre
outras coisas graves e muito graves) contradizer-se em palavras e atos,
supõe-se que a "matéria" à qual o articulista se refere será a do
"cidadão", em oposição à do"político". Querendo talvez
assim dizer que não lhe relevam para juízo de seriedade e confiança as
aldrabices que políticos operam na política, mas sim as que possam cometer fora
dela.
É
uma perspetiva interessante, esta, que retira à política toda e qualquer
veleidade de contar para alguma coisa no julgamento de caráter que se faz dos
seus protagonistas, deslocando para fora dela a discussão que interessa - a
quem devemos confiar o nosso voto? - logo dando carta branca a todas as
patifarias, desde que "políticas",enquanto se lançam matilhas a
cheirar os fundilhos dos "cidadãos" à procura de "podres".
Que quem isto pratica venha depois impacientar-se com "a falta de
propostas concretas" deste ou daquele não deixa de maravilhar.
Sucede
que no caso
houve-ou-não-houve-pagamentos-de-5000-euros-por-mês-da-Tecnoforma-a-Passos-enquanto-era-deputado
não está em causa "o cidadão Passos Coelho", mas o político. E
porquê? Porque ter recebido aqueles valores implicará ter cometido uma dupla
fraude, ao não os declarar ao fisco e ao certificar que estava emregime de
exclusividade para poder receber um subsídio de reintegração de 30 mil euros ao
sair do parlamento, e Passos primeiro-ministro recusou esclarecer. Não sendo
crível que não saiba se recebeu ou não, ao remeter para a PGR o esclarecimento,
dizendo que "retirará as consequências", não está só a faltar à
verdade; está a admitir que pode ter cometido crimes (que, literalmente,
suspeita de si próprio), prefigurando a possibilidade de se demitir - mas
apenas, note-se este apenas, se alguém conseguir prová-los.
Partindo
do princípio de que o PM não está doido varrido só faz, se pode fazer algum,
sentido pedir para ser investigado se está inocente - ou se tem a certeza, ou
quase, de nada se poder encontrar que prove o contrário (ou que nada vai ser
investigado, como sucedeu).
Assim,
para além de uma instrumentalização política do Ministério Público sem
precedentes em qualquer governante da democracia, tal significa que Passos
está, nesta fuga para a frente, como Portas há um ano, a jogar o País ao póquer
(já não interessam os mercados?) na perspetiva de "voltar" reforçado
para as batalhas - e eleições - que se seguem. Face a tal traquibérnia, as
fraudes de que é suspeito são brincadeiras de crianças - mas, lá está: trata-se
de "política."
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