Nuno Ribeiro - Público
A conferência
organizada pelo ex-Presidente da República pretende ser, desta vez, mais
abrangente do que a de Maio. Além das esquerdas, conta com figuras de
centro-direita.
Cinco meses depois
de na iniciativa “Libertar Portugal da Austeridade” ter alertado Cavaco Silva
para “a perda de pacifismo” dos portugueses, o ex-Presidente da República sobe
um degrau: vai desafiar Cavaco à demissão.
A intervenção de
dez minutos não está redigida. Será com o apoio de notas que Mário Soares
pronuncia na noite desta quinta-feira, na aula Magna da Reitoria da
Universidade de Lisboa, o discurso de abertura da Conferência “Em defesa da
Constituição, da Democracia e do Estado Social”.
“É preciso que o
Presidente da República cumpra o juramento de cumprir e fazer cumprir a
Constituição, senão é Presidente de uma minoria”, disse Mário Soares ao
PÚBLICO. Soares considera que o Governo ignora o texto constitucional, ao ponto
de o trivializar quando afirma que, apesar de estar consagrado o direito ao
trabalho, a Constituição não dá emprego. Também segundo o ex-Presidente, as
privatizações são a venda do país a retalho, e os cortes nas pensões põem o
Estado Social em causa. Pelo que, para Mário Soares, ao caucionar esta política
Cavaco está a ser parcial e a defender as políticas do executivo liderado pelo
seu partido.
“Faça o que deve:
demita-se enquanto pode ir para casa sossegado”. Foi este o conselho que Soares
deu a Cavaco em artigo de opinião publicado na terça-feira no DN. Em entrevista
à TVI24, insistiu: “Naturalmente, eu acho que o Presidente da República devia
demitir-se porque está numa situação impossível, à partida só fala com um
partido e isso não tem sentido nenhum.”
Deste modo, o
desafio da demissão é o corolário lógico de sucessivas intervenções.
Pronunciado, sim, na solenidade de uma conferência que, ao contrário da
iniciativa de Maio, é mais abrangente. Então, foi a esquerda a ser convocada
para um ponto de encontro. Esta noite, o debate centra-se na defesa da Constituição
e do Estado Social. Por isso, congregou mais vontades.
A iniciativa
concitou diversos apoios. Entre os promotores, para além de Soares, estão
António Arnaut, os sindicalistas Carlos Silva (UGT) e Armando Farias (CGTP),
Manuel Alegre, Boaventura Sousa Santos, Maria do Rosário Gama, da APRE!
(Associação de Pensionistas, Reformados e Aposentados), Pacheco Pereira e
Sampaio da Nóvoa, ex-reitor da Universidade de Lisboa. “Estamos num período
difícil da democracia que passa por um ataque à Constituição e às instituições
que a defendem, como o Tribunal Constitucional”, comentou Sousa Santos ao
PÚBLICO. “A Constituição foi o patamar comum, é preciso manter esse património
a partir do qual construímos as nossas divergências”, salientou.
Serão lidas mensagens
de Jorge Sampaio, dos generais Loureiro dos Santos, Pires Veloso, Lemos
Ferreira e Manuel Monge, de António Capucho e Basílio Horta. “É uma iniciativa
abrangente, ao contrário da anterior, apanha uma área que vai até ao
centro-direita”, afirmou Loureiro dos Santos ao PÚBLICO. O ex-ministro da
Defesa Nacional de Mota Pinto e Lurdes Pintassilgo manifesta preocupação pela
manutenção do Estado Social e pelo desmantelamento das estruturas de soberania
nacional, como as Forças Armadas. Foi enviado um convite ao presidente da
Câmara do Porto, Rui Moreira que, ao meio da tarde desta quarta-feira, ainda
não tinha confirmado o envio de mensagem.
Presentes vão estar
personalidades como António Costa, Alberto Martins, líder da bancada
socialista, o que representa uma promoção pois, em Maio, o representante do PS
foi o deputado Ramos Preto. De acordo com os promotores, o secretário-geral do
PS esteve desde início ao corrente da iniciativa. Entre as presenças
confirmadas destaque, ainda, para Don Januário Torgal Ferreira, antigo bispo
das Forças Armadas, o dominicano Frei Bento Domingues e o general Melo Gomes.
Se Mário Soares
abre as intervenções, o ex-Chefe do Estado-Maior do Exército, general Pinto
Ramalho encerra a sessão. Haverá também intervenções de Pacheco Pereira, Carlos
do Carmo, Alfredo Bruto da Costa, Helena Roseta, Marisa Matias e Ruben de
Carvalho. “Trata-se de uma iniciativa que se esgota no mesmo dia e, tendo em
conta os objectivos, naturalmente que estaremos presentes”, disse esta
quarta-feira Jerónimo de Sousa. “Os debates em torno da defesa da Constituição
e do combate a estas políticas de austeridade são matérias que hoje inquietam a
maioria dos portugueses”, destacou o secretário-geral do PCP.
“Esta é uma questão
de puro patriotismo, espero que o Presidente da República tenha consciência que
há muita gente que já fala de violência, eu estou aqui para lutar contra a
violência”, referiu Mário Soares ao PÚBLICO. “Este Governo está a destruir o
país, espero que caia”, concluiu.
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