Wprost,
Varsóvia – Presseurop – imagem Tom
Janssen
A 19 de novembro, o
Parlamento ucraniano voltou a adiar a votação sobre a libertação da líder da
oposição Iulia Tymoshenko, comprometendo assim a assinatura de um acordo de
associação com a UE na próxima semana. Se fosse assinado, o acordo permitiria
facilitar o comércio com um mercado que a Rússia guarda ciosamente.
Chapéus vermelhos e
amarelos, mesas desdobráveis, bandeiras enormes. Apesar de ser altamente
improvável que a Ucrânia assine o acordo de associação com a União Europeia nos
tempos mais próximos, este é o jogo político que decorre na Praça Sobornaya de
Odessa.
Estão a ser recolhidas
assinaturas, tanto pelos que defendem o acordo com a UE, como pelos que querem
a unificação com a Rússia. De um lado os nacionalistas dos partidos Svoboda e
Batkivshchyna, do outro os comunistas e simpatizantes do partido Rodina.
O líder deste último,
o ex-deputado Ihor Markov, tornou-se na mais recente vítima do jogo geopolítico
que definirá o futuro da Ucrânia. Foi preso no final de outubro, acusado de
hooliganismo e condenado a ficar na prisão até 20 de dezembro. Os seus
apoiantes afirmam que foi preso por ser demasiado pró-Moscovo, até mesmo para
os partidos regionais pró-russos. Os seus opositores dizem que Markov é um
agente russo que se tornou demasiado perigoso, até para o Presidente Viktor
Yanukovych.
O charme discreto
do Império
Em muitos locais de
Odessa encontramos símbolos da antiga glória. As casas de arte nova são
lindíssimas, mas estão num tal estado de desmazelo que temos medo de lá entrar,
não vá o teto cair-nos na cabeça. Aqui toda a gente fala russo, que é a língua
franca nas lojas, escritórios e restaurantes. O único sítio onde se fala
ucraniano é na sede local do partido Svoboda. Segundo Pavel Kirilenko, político
na casa dos 30 anos que representa o partido no Parlamento ucraniano (Verkhovna
Rada/Conselho Superior), ainda é possível uma associação com a UE, de resto a
única opção viável para o futuro do país.
“Independentemente
da forma como o caso de Iulia Tymoshenko acabar, a UE deveria pronunciar-se
pela assinatura do acordo”, afirma Kirilenko. Acredita que isso não só ajudará
a impulsionar a economia ucraniana, a melhorar os padrões políticos e a reduzir
a corrupção desenfreada, como permitirá à Ucrânia tornar-se verdadeiramente independente
da Rússia.
“Os custos podem
ser elevados: boicotes aos produtos ucranianos na Rússia, talvez mesmo
tentativas para separar a Crimeia da Ucrânia. Mas quanto mais depressa o
fizermos, melhor”, defende o jovem deputado.
Em Odessa, a
questão da integração na UE acaba por ser vista como a questão da Rússia.
Kirilenko está muito satisfeito por o “agente russo”, como chama ao influente
Ihor Markov, líder do partido Rodina, estar na prisão. Até há pouco, Markov
fora deputado pelo Partido das Regiões e era considerado próximo do “Donetsk
lobby”. Mas as suas opiniões são controversas, mesmo pelos padrões ucranianos:
Markov considera que a Ucrânia é um estado sazonal que deveria retornar ao
rebanho do império russo.
Dito isto, as
razões oficiais para a sua prisão soam a falso. Em 2007, Markov levou a cabo
com sucesso uma campanha para erigir em Odessa um monumento à imperatriz russa
Catarina II. Durante uma manifestação do partido Svoboda, houve uma luta e
Markov alegadamente agrediu um manifestante. Até agora ninguém tinha prestado
muita atenção ao incidente mas como Markov perdeu a imunidade parlamentar, foi
preso.
A contenção de
Iulia
Antes da sua
prisão, não existiam dúvidas de que Ihor Markov, que tinha no seu escritório um
retrato de Vladimir Putin e passava mais tempo em Moscovo do que em Kiev, era
um político pró-russo. Segundo o jornalista da rádio Svoboda, Ivan Shevchuk,
ele fazia parte de uma gigantesca campanha, controlada diretamente por Moscovo
que tinha por objetivo evitar que a Ucrânia fizesse qualquer associação com a
UE. “Ninguém sabe ao certo quanto, mas foi investido muito dinheiro com esse
fim”, afirma Shevchuk.
Vladymir Mamonov,
um empresário pró-russo, afirma que o acordo de associação com a UE seria um
“desastre” e mataria a economia ucraniana. “Temos relações sólidas com outros
Estados pós-soviéticos. Não se podem separar vasos comunicantes: sem acesso ao
mercado russo ou ao seu gás, a economia ucraniana sofrerá um duro golpe.”
Além disso, Mamonov
está irritado com o que apelida de propaganda pró-UE. “Pat Cox e Aleksander
Kwaśniewski não deveriam dizer a um país soberano para alterar as suas leis só
para Tymoshenko poder ser libertada”, acrescenta.
Segundo Shevchuk,
esta última condição foi, desde o início, considerada inaceitável pelo
Presidente Yanukovych. “Ele tem medo de perder as eleições presidenciais e se
Tymoshenko for libertada, a sua vitória pode estar em perigo”.
Segundo o
jornalista da radio Svoboda, Yanukovych tem dois objetivos: que a sua família
seja a mais rica da Ucrânia (o seu filho, Alexander, é já um dos maiores
oligarcas) e governar o máximo de tempo possível. Para isso precisa de dinheiro
– e não interessa se vem da Rússia ou da UE.
Estratégia
multivetorial
Por isso, a melhor
decisão para o Presidente Yanukovych seria não haver decisão nenhuma.
Seguramente não quer o acordo de associação com a UE, nem está interessado em
juntar-se à união aduaneira com a Rússia, a Bielorrúsia e o Cazaquistão, que
Moscovo está a tentar forçar. No seu cenário ideal, Yanukovych preferiria
continuar com a estratégia “multivetorial” do antigo Presidente Leonid Kuchma:
receber dinheiro de onde for possível em troca de promessas vãs. O problema é
que esta política já teve os seus dias e não há forma de voltar atrás.
A economia do país
está em situação precária e o Governo precisa de dinheiro antes das eleições
presidenciais de 2015. Pode ir buscá-lo a Leste ou a Oeste, mas quem lho
conceder vai ditar condições. Moscovo é um negociador duro e as visitas de
Yanukovych não produziram qualquer resultado. O Kremlin quer que a Ucrânia
adira à União Aduaneira porque a Rússia quer controlar a indústria ucraniana –
e isso é algo que ameaça diretamente os interesses de Yanukovych e dos
oligarcas mais próximos dele.
Segundo o
jornalista da “Voz da Rússia”, Dmitry Babich, Moscovo precisa de manter a sua
influência sobre a Ucrânia se quiser continuar a ser um poder global. “A questão
é puramente económica. Se a Rússia quiser ser um centro financeiro, precisa de
um mercado de, pelo menos, 200 milhões de consumidores. Como tem 140 milhões,
onde encontrar os 60 milhões que faltam? A resposta é óbvia: persuadir a
Ucrânia a juntar-se à zona económica comum”, explica Babich. No entanto,
existem motivos políticos por detrás deste raciocínio económico.
Uma coisa é certa:
mesmo que o acordo de associação entre a UE e a Ucrânia não seja assinado na
cimeira de parceria de Leste, em Vílnius, a 28 e 29 de novembro, não será o fim
do caminho para o futuro da Ucrânia – apenas o início.
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