Eduardo
Oliveira Silva jornal i, editorial
A
greve dos médicos pode ser corporativa, mas é também em defesa do SNS, a grande
conquista da democracia
Como
é evidente, não se pode dissociar a greve que a Federação Nacional dos Médicos
(FNAM) convocou para ontem e hoje, com o apoio explícito da Ordem dos Médicos,
de uma reivindicação corporativa e política, tanto mais que a entidade sindical
convocante integra a CGTP.
Há,
portanto, um factor de contestação política ao governo que subjaz a esta acção.
Dito isto, existem outros argumentos usados pelos grevistas que têm forte razão
de ser, nomeadamente a denúncia da degradação do Serviço Nacional de Saúde
(SNS).
Ora essa é uma realidade objectiva que abrange não só os cuidados prestados pelos médicos, mas todos os outros dados por profissionais de saúde e todas as áreas que servem o SNS.
Se, do ponto de vista da situação profissional, as razões dos médicos podem não ser óbvias, uma vez que se trata de uma classe de pleno emprego e que tem também a emigração (lamentavelmente) como alternativa garantida, o protesto contra a degradação do SNS é, obviamente, um motivo mais do que suficiente. Isto porque se trata de uma realidade objectiva até para o Sindicato Independente dos Médicos, que não aderiu à paralisação.
Depois
de ter entrado bem no governo e de ter conseguido poupanças significativas e
racionalizações de custos, nomeadamente na contracção de preços dos
laboratórios e no combate ao desperdício, Paulo Macedo ficou politicamente
exausto. Agora, a sua política é pura e simplesmente de corte, abrangendo todas
as áreas e até mesmo as situações mais complexas de alguns doentes, como
tristemente ilustram as dezenas de notícias que jornais e televisões publicam.
A fase da racionalização caiu por terra e entrou-se no subfinanciamento crónico do SNS, alimentado por balões de oxigénio de vez em quando, ao verificar-se que o sistema está a colapsar. O último exemplo data de ontem, quando a greve começou. Numa entrevista, o ministro tentou reduzir as razões dos médicos grevistas a uma conspiração política concertada com a CGTP. No entanto, fez saber que ia finalmente libertar 300 milhões para diminuir o grau de subfinanciamento do SNS que a própria troika veio a reconhecer quando procedeu à 11.ª avaliação. Não havia melhor momento para dar força a um dos fundamentos da greve.
Entretanto,
o ministério deu conta de que o diploma que vai regular os códigos de ética dos
120 mil funcionários do SNS (conhecido por lei da rolha, já que na origem
pretendia limitar o direito de os profissionais denunciarem a existência de
problemas nas suas instituições) foi enviado para publicação. O documento foi,
entretanto, expurgado dos seus aspectos mais controversos, o que tende também a
dar razão aos profissionais de saúde.
A
greve em curso tem um impacto forte mas não drástico, a avaliar pelas notícias
de ontem. Muitos doentes perderam consultas, tratamentos e operações. É,
obviamente, lamentável. São eles que mais sofrem e, por isso, por muita razão
que os médicos possam ter, é preciso que tenham consciência de que não podem
transformar estes protestos numa atitude regular, sob pena de perderem a parte
da razão que lhes assiste e o respeito dos seus concidadãos.
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